Folha de S. Paulo


Análise

Nobel de Física é inevitável fonte de frustração para público leigo

Todo ano, com o Nobel de Física, surge um sazonal interesse geral pela disciplina.

Inevitavelmente, o leigo acaba um pouco frustrado pela limitada capacidade que não físicos têm de entender as descobertas premiadas.

Vejamos 2015. Neutrinos têm massa. Sabemos isso porque neutrinos que viajam do Sol até a Terra mudam de tipo (ou "sabor", dizem os físicos).

Com boa vontade, o leigo –muitas vezes um sujeito instruído– pergunta: por que o fato de neutrinos mudarem de "sabor" significa que eles têm massa? O que impede um neutrino sem massa de mudar?

Não há, infelizmente, uma boa resposta intuitiva. Entender isso passa pelas equações da mecânica quântica.
Bom, a mecânica quântica... Alguns físicos sobre ela:

"Acho que posso dizer de modo seguro que ninguém entende a mecânica quântica. Eu nunca avancei ao ponto de ela ter se tornado óbvia para mim. Na verdade, eu ainda fico nervoso com ela" - Richard Feynman.

"Não busque aprender mecânica quântica com palavras. Se você quer entendê-la, limite-se à matemática. O importante são as equações" - Freeman Dyson.

"Aqueles que não ficam chocados quando apresentados à mecânica quântica não a entenderam" - Niels Bohr.

O avanço da física foi tamanho que ela se descolou da intuição. Nosso cérebro não está preparado para pensar em partículas muito pequenas ou nas imensidões da cosmologia. Não evoluímos para isso.

O próprio Einstein ficou incomodado com o caráter probabilístico da mecânica quântica -o fato de uma partícula poder estar e não estar em um lugar ao mesmo tempo. (E tem também o pitoresco gato de Schrödinger, vivo e morto simultaneamente.)

Sempre houve certa contraintuitividade na ciência -a Terra não é plana, o Sol não gira ao redor da Terra-, mas a bizarrice das descobertas foi a outro grau no século 20. Mesmo Feynman se ressentia de não conseguir explicar a seu pai, um vendedor cuja inteligência admirava, tópicos da física moderna.

Infelizmente, a necessidade de alto formalismo matemático para "entender" a física atual cria um muro entre especialistas e o resto do público instruído, algo que reforça a divisão da vida intelectual entre cientistas e humanistas, apontada já em 1959 pelo físico e escritor inglês C.P. Snow.

"Pergunto a pessoas instruídas se elas sabem qual a segunda lei da termodinâmica. A resposta é sempre negativa. Mas isso é o equivalente científico de perguntar se a pessoa já leu Shakespeare."

(Em tempo, uma maneira de enunciar a segunda lei é esta: o calor não pode fluir, espontaneamente, de um corpo mais frio para outro mais quente.)

Premio Nobel


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