Folha de S. Paulo


Nasa detecta correntes de água salgada nas encostas de Marte

Nasa/Associated Press
Imagem divulgada pela Nasa que mostra correntes de água na superfície de Marte
Imagem divulgada pela Nasa que mostra correntes de água na superfície de Marte

Dados colhidos por uma espaçonave da Nasa confirmam que fluxos de água salgada escorrem pela superfície de Marte todos os verões. A descoberta aumenta a possibilidade de que exista, ainda hoje, alguma forma de vida no planeta vermelho.

O estudo foi liderado por Lujendra Ojha, do Instituto de Tecnologia da Georgia, em Atlanta, e anunciado pela agência espacial americana nesta segunda (28). Os resultados foram publicados no site da revista "Nature Geoscience".

O achado põe fim a um mistério que já durava quatro anos –o que são as ranhuras que apareciam em encostas da superfície marciana durante o verão.

Conhecidas pela sigla RSL (que significa linhas recorrentes de encosta), elas foram detectadas em 2011 pelo satélite MRO (Mars Reconnaissance Orbiter). Na ocasião, já se desconfiava que o fenômeno pudesse estar atrelado à existência de água.

Tanto a aparência das manchas quanto a coincidência com períodos mais quentes (em alguns momentos com temperaturas acima de 0°C) apontavam para essa direção.

Agora, os cientistas conseguiram confirmar isso graças a um instrumento do MRO, o Crism (leia quadro nesta pág.). Em essência, ele observa a superfície e faz uma medição completa da luz detectada para identificar as substâncias que a emitem.

Nas ranhuras, o aparelho indicou que havia sais hidratados (clorato de magnésio, perclorato de magnésio e perclorato de sódio), que só podem se formar na presença de água líquida.

"Nossas descobertas apoiam fortemente a hipótese de as linhas recorrentes de encosta se formarem como resultado de atividade de água contemporânea em Marte", concluem os pesquisadores no artigo na "Nature Geoscience".

Infográfico: Água em Marte

PROMESSA DE VIDA?

A busca por sinais de água em estado líquido no planeta vermelho está inevitavelmente ligada à procura por vida. Os cientistas consideram a água o composto fundamental capaz de abrigar as reações químicas complexas necessárias aos seres vivos.

Daí a animação da Nasa. O fato de que Marte ainda hoje tem fluxos de água sugere não só que talvez existam abrigos para formas de vida atualmente como também valida descobertas recentes que revelam que o planeta vermelho foi muito mais hospitaleiro no passado, com oceanos inteiros sobre sua superfície.

Contudo, nem todos são otimistas sobre essa possibilidade, já que essa água é muito mais salgada que os oceanos da Terra.

"É até mais salgada que o lago Don Juan, na Antártida, que é a água líquida mais salgada da Terra", diz o astrobiólogo Chris McKay, do Centro Ames de Pesquisa, da Nasa. "Nada pode viver nela."

Ele aposta que a presença de vida em Marte –se houver– estará em regiões mais frias, menos próximas da zona equatorial, e abrigada no subsolo.

O mesmo afirma o brasileiro Nilton Rennó, pesquisador da Universidade de Michigan (EUA) que trabalhou na missão Phoenix, que pousou perto do polo Norte marciano.

"O problema é que as RSL se formam em lugares muito quentes, onde água líquida evaporaria muito depressa", disse à Folha. "No local da Phoenix [mais frio], a água salgada poderia ser estável."

FUTURO

O próximo passo é tentar identificar se o nível de habitabilidade passado ou presente de fato conduziu ao surgimento da vida.

Para isso, os cientistas da Nasa acreditam que será necessária uma missão de retorno de amostras.

"Provavelmente, só conseguiremos ter certeza sobre a existência de vida em Marte com a análise de amostras em laboratório", afirmou Jim Green, diretor de ciência planetária da agência espacial, durante a entrevista coletiva.

A Nasa planeja, para 2020, um novo jipe para recolher e armazenar amostras, de forma que uma missão futura possa encaminhá-las para a Terra. Mas não há planos concretos para esse resgate.


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