Folha de S. Paulo


Seca em SP pode virar rotina, mostra pesquisa

A secura fora da época que quase levou ao colapso o abastecimento de água da Grande São Paulo no começo deste ano de fato foi um evento climático fora de série –mas a situação do problema a longo prazo também não é nada boa, indicam estudos ainda não publicados de cientistas do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).

Fenômenos como o aumento da temperatura média em todo o país desde os anos 1960 ou a diminuição das chuvas na maior parte das áreas que abastecem o sistema Cantareira desde os anos 1980 aumentam a preocupação de que algo parecido com a crise hídrica de 2014-2015 possa se tornar rotina.

Paulo Nobre, meteorologista do Inpe, mostrou esses resultados na reunião anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), realizada em São Carlos.

Ele explicou que não é possível associar qualquer evento climático específico ao aquecimento global, mas destacou que pode-se dizer que as mudanças climáticas globais tornam certos eventos mais prováveis.

Um dos trabalhos ainda inéditos dos pesquisadores do Inpe mostra, por exemplo, o aumento constante das temperaturas médias em todo o país desde os anos 1960 até 2010. O ar mais quente, lembrou Nobre, é capaz de dissolver mais vapor d'água, levando a nuvens mais poderosas e chuvas mais intensas.

Ocorre, porém, que o fenômeno tem efeito paradoxal: as chuvas podem ficar mais fortes, porém com distribuição mais concentrada –mais tempestades em poucos momentos do ano e menos chuvas suaves e comuns.
Outro estudo preliminar do Inpe tentou examinar como anda a "conta corrente hídrica" do Brasil. A conta incluiria o quanto o país tem recebido de chuva e o uso da água pela atividade humana.

Resultado: com base no clima que prevalecia no país até os anos 1960, a maior parte das regiões do Brasil tem ficado no "cheque especial".

Em escala mais local, a situação não fica muito melhor. Na área que abastece o sistema Cantareira, a média de chuva nos meses de verão é de 1.000 mm. Nesta década, caiu para cerca de 800 mm.

Como não é possível mexer diretamente nos padrões climáticos no curto prazo, Nobre afirma que o melhor remédio é repensar a prioridade dada à cobertura florestal das áreas mais ameaçadas pela falta d'água. A região do Cantareira, por exemplo, perdeu cerca de 80% de sua vegetação original.


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