Seu cocô mostra quem você é, descobriu um grupo de pesquisadores de Harvard.
Os cientistas apostam que isso pode ter uma importante aplicação forense, na identificação de indivíduos, somando-se a outras técnicas agora emergentes.
A pesquisa americana mostrou que um estudo da microbiota intestinal presente nas fezes permite identificar o indivíduo em 83% dos casos. A pesquisa saiu na revista científica "Pnas".
Não é perfeito, claro –para identificar sem chance alguma de erro uma pessoa específica no mundo, é preciso ter nada menos do que 99,99999999% de precisão.
A questão é que, como nenhuma técnica atinge tal nível de sofisticação, a medicina forense caminha mais e mais para a sobreposição de metodologias.
Se, em vez da microbiota, a análise for de DNA, atualmente qualquer gota de suor, perdigoto de saliva e até mesmo esbarrão em algum objeto podem deixar para trás material suficiente para identificar alguém.
Até pouco tempo, a análise das impressões digitais deixadas era o suprassumo da identificação. Quando as impressões são intencionais, como nas cédulas de RG, é fácil matar a charada. Entretanto, quando deixadas de forma não intencional, as imagens formadas são parciais e fracas, dificultando uma identificação perfeita.
Outra técnica tradicional, é o exame da arcada dentária, mas ele obviamente não se aplica a todos os crimes.
VOCÊ É O QUE VOCÊ COME
As bactérias presentes no intestino podem indicar ainda o tipo de dieta (rica em fibras, vegana ou deficiente em vitaminas, por exemplo), estado geral de saúde, a idade e até mesmo em que lugar do planeta a pessoa reside, conforme os tipos e bactérias característicos de cada pessoa.
A análise do microbioma humano (bactérias e outros micro-organismos presentes no nosso corpo) já permeia diversas áreas da medicina. Doenças como diabetes, hipertensão e obesidade podem ser parcialmente explicadas pelas bactérias que carregamos em nossos intestinos.
Segundo o perito da Polícia Federal, Jorge Freitas, a ciência de identificação evoluiu muito nos últimos 20 anos, mas ainda levará algum tempo para que ela incorpore a análise do microbioma.
Para ele, a técnica provavelmente servirá inicialmente como critério de eliminação –ou seja, para apontar quem não é o criminoso, em vez de quem é–, como acontecia nos primórdios da identificação pelo sistema ABO de tipo sanguíneo.
CÂMERAS
Outras técnicas que têm avançado e já auxiliam a resolver crimes se relacionam com a computação.
Com tantas câmeras espalhadas pela cidade, por exemplo, reconstruir em código digital um retrato de um suspeito não é difícil –e esse recurso já tem sido bastante utilizado para se identificar (ou excluir) suspeitos.
Funciona assim: o rosto na imagem é subdividido em pequenos pedaços que ganham uma codificação binária (0 ou 1). Esse código permite a comparação computacional com bancos de imagens de criminosos –se a chance de ser a mesma pessoa na foto for alta, o sistema avisa.
Até o ritmo em que uma pessoa digita em um computador pode ser usado para identificá-la. Num mundo hiperconectado, não faltam recursos para que as pessoas se sintam tão seguras quanto vigiadas.
ARTE
A identificação de pessoas pelo DNA chegou ao nível da arte quando a artista americana Heather Dewey-Hagborg recolheu gomas de mascar e cigarros na rua para fazer o "retrato molecular" de como poderia ser o rosto dos porcalhões.
O código genético foi lido para fazer uma previsão de várias características, como tom de pele ou mesmo o formato do rosto e a altura das "maçãs".
Heather Dewey-Hagborg | ||
Retrato digital construído a partir amostra 3, uma bituca de cigarro encontrada na rua |
Um projeto em Hong Kong usou o mesmo princípio e publicou um "mural da vergonha" com a imagem "prevista" de quem largou vestígios, como copos e camisinhas pelas ruas. A meta é conscientizar a população a manter a cidade limpa.
Essa novidade, por enquanto, não será implantada no país, explica o perito da Polícia Federal Jorge Freitas. "Como a população é muito miscigenada, não dá para ter certeza nem sobre as características mais básicas."
No Brasil, as características buscadas são aquelas não físicas e não comportamentais, como o sexo. Ou seja, o DNA não é mais que uma "superimpressão digital", tendo seu potencial de grande dedo duro ainda adormecido no país.
BANCO DE GENES
Como medida para melhorar a caça aos bandidos, a Polícia Federal criou um banco de dados para armazenar o perfil genético de criminosos.
"Se o cara rouba um banco e deixa um chiclete, guardamos o perfil no banco de dados. Se ele for preso em algum outro delito, pode haver a identificação posterior", explica Freitas.
Pela lei, quem é condenado por crime hediondo tem que fornecer DNA para o banco.
A Inglaterra criou seu banco de dados genéticos na década de 1990 e já tem o perfil de mais de 5 milhões de indivíduos. Mais de 400 mil associações entre suspeitos e amostras foram realizadas.
Incipiente, o banco nacional tinha, até março (data do último relatório), pouco mais de 2.500 perfis.