Folha de S. Paulo


Cientistas buscam explicações da física para existência do universo

O Grande Colisor de Hádrons voltou à ativa em junho, esmagando partículas subatômicas com quase o dobro da energia usada para descobrir o bóson de Higgs, um marco na compreensão da composição do mundo físico.

Com o Higgs desvendado, os pesquisadores agora estão de olho em algo mais exótico: sinais de uma nova física que não só descreva o universo como também explique por que ele é do jeito que é.

Quatro forças fundamentais governam a realidade, mas por que não são 3, 5 ou 17?

A matéria é constituída a partir de uma miscelânea de partículas cujas massas diferem tanto que parecem ter sido distribuídas por um deus embriagado. O próton tem 99,86% da massa do nêutron, e ambos têm mais de 1.835 vezes a massa do elétron.

Esses valores, como todos os outros que compõem a folha de especificações do universo, parecem arbitrários demais. No entanto, se fossem ligeiramente diferentes, o universo não teria dado origem à vida inteligente, segundo os cientistas.

Rejeitando a hipótese de que isso não tenha passado de um golpe de sorte, os físicos estão à procura de um princípio subjacente –uma explicação convincente para o fato de tudo ter acontecido dessa maneira específica.

Não é assim que costumamos pensar na história humana. A cada fato os caminhos se bifurcam, e só um deles leva ao futuro. Escolha um entre a infinidade de possibilidades não ocorridas e já poderíamos estar vivendo num mundo muito diferente.

No entanto, a física não funciona assim: se um número chamado alfa, que governa a força do eletromagnetismo, fosse infimamente maior ou menor, as estrelas não poderiam ter se formado, deixando um vazio sem vida.

O valor de alfa parece algarismos gerados aleatoriamente: 0,0072973525698. Um dos maiores mistérios da física, segundo o físico Richard Feynman, consiste em "um número mágico que escapa da compreensão humana".

Outros valores, como a massa do bóson de Higgs, ou a intensidade da força que une os núcleos dos átomos, parecem calibrados com o mesmo esmero. Bastaria mexer um pouco nos ponteiros que o nosso universo talvez não existisse tal como ele é.

A teoria das cordas –com suas dimensões extras e geometrias que lembram biscoitos trançados– era tão hipnotizante quando ganhou proeminência, três décadas atrás, que parecia certo ser válida. Afinal, tratava-se, depois de decifrada, de uma descrição muito bem amarrada de um universo como o nosso.

Só que a teoria das cordas descambou para outra direção, prevendo uma infinidade de outros universos, cada um com uma física diferente, mas impossíveis de serem observados –com exceção do nosso.

É possível que alguns dos outros universos tenham gerado diferentes tipos de seres conscientes, feitos a partir de outra coisa que não átomos –e todos eles tão perplexos (em alguma insondável forma equivalente de perplexidade) quanto nós.

Ou talvez o multiverso inteiro seja apenas uma forma complexa de expressar que existem infinitas maneiras pelas quais este Universo (singular e com U maiúsculo) poderia se desenrolar.

Há anos os teóricos se dividem entre aqueles que rejeitam o multiverso, por entendê-lo como "um pretexto de proporções infinitas para se esquivar", como escreveram Natalie Wolchover e Peter Byrne no ano passado na revista "Quanta", e aqueles que insistem que a ideia é poderosa demais para estar errada, mesmo se não houver uma forma de verificar se algum outro universo existe.


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