Folha de S. Paulo


Cientistas brasileiros usam açafrão para eliminar mosquito da dengue

Natália Inada e Vanderlei Bagnato
Fluorescência em verde mostra ação da substância curcumina no tubo digestivo de larva de mosquito.
Fluorescência em verde mostra ação da substância curcumina no tubo digestivo de larva de mosquito

Receitas caseiras para espantar o mosquito da dengue, como usar pó de café ou fazer misturas usando cravo ainda não têm grande respaldo científico, mas no armário de temperos pode sim haver um inseticida formidável: o açafrão.

Cientistas da USP de São Carlos e da Ufscar (Universidade Federal de São Carlos) viram que a curcumina, molécula presente no tempero, prejudica o desenvolvimento das larvas de Aedes aegypti, o vetor da dengue, impedindo que cheguem à fase adulta.

A ideia dos pesquisadores é que em alguns locais onde se acumula água, como poças, pequenos lagos e até a água de beber do cachorro possam ser tratados com o produto. A curcumina também pode funcionar bem para evitar mosquitos em pratinhos de plantas. "Colocar água sanitária no prato as agride. Eu já testei", afirma o cientista Vanderlei Bagnato, da USP de São Carlos.

A água fica um pouco amarelada, mas a molécula se degrada e ela volta a ficar transparente, conta o professor. Isso é sinal de que a curcumina já perdeu sua eficácia, e que a aplicação tem de ser refeita. "Pode não ser a solução definitiva para todos os focos, mas nossa obrigação é tentar fazer algo", diz Bagnato.

AÇÃO

A curcumina e algumas moléculas semelhantes a ela –os curcuminoides– fazem com que as larvas dos Aedes se tornem fotossensíveis e morram quando expostas à luz do sol, de lâmpadas fluorescentes ou de LEDs. Uma quantidade baixa (15 mg para cada litro de água) é capaz de praticamente liquidar larvas que estejam expostas ao sol.

Forest and Kim Starr/Flickr
_Curcuma longa_ (esq), também conhecida como açafrão-da-índia, cujas raízes (dir) fornecem a curcumina
Curcuma longa (esq), também conhecida como açafrão-da-índia, cujas raízes (dir) fornecem a curcumina

"O surpreendente é que as pessoas vêm usando o açafrão [sem processamento químico] contra os mosquitos e o número deles diminui", conta Bagnato.

A pesquisa está sendo feita no Centro de Pesquisa em Óptica e Fotônica, em São Carlos, um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).

O uso medicinal do açafrão e da curcumina não é novo. O tempero está inserido na cultura hindu como um remédio há milhares de anos e os cientistas já vêm testando a curcumina contra inflamações, cáries, neovascularização da córnea (aumento indesejado de vasos sanguíneos, que prejudica a visão) e câncer, por exemplo.

O próximo passo é o teste em grande escala em alguma cidade que esteja sofrendo com a dengue, diz o professor. Ele está à procura de parceiros nos setores público ou privado que queiram levar a ideia adiante.


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