Folha de S. Paulo


Bactérias modificadas conseguem denunciar câncer no xixi e viram arte

"Há mais bactérias em nossos corpos do que estrelas em nossa galáxia", filosofa Tal Danino, 32, bioengenheiro americano do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT). Ele fez desses micro-organismos sua fonte de inspiração pelos últimos dez anos, seja para tratar câncer ou fazer arte.

Primeiro, o câncer: sua pesquisa mais recente mostra como uma bactéria geneticamente modificada e administrada via oral é capaz de detectar câncer de fígado –mudando a cor da urina– e até de diminuir o tamanho do tumor.

"Hoje em dia, podemos programar bactérias da mesma forma como fazemos com computadores –podemos escrever e imprimir DNA", disse Danino. As bactérias que ele "programou" produzem uma proteína fluorescente, criando o que ele apelidou de "supernova", devido à explosão de cores.

Na nova plataforma para diagnosticar câncer, utilizada com sucesso em ratos de laboratório, Danino e sua equipe do MIT usaram probióticos E. Coli da cepa nissle 1917 (EcN) para encontrar metástases de câncer em até 24 horas, colonizar esses tumores e produzir enzimas que mudam a cor da urina.

"Descobrimos que a bactéria cresce dentro do câncer de fígado, talvez por haver uma grande quantidade de sangue que vem do intestino para o fígado", diz Danino à Folha durante o TED, evento de palestras em Vancouver.

"Como o sistema imunológico não tem acesso ao tumor, significa que a bactéria pode se esconder lá e crescer rapidamente, produzindo moléculas que mudam a cor da urina do paciente."

No caso, o xixi do paciente do câncer fica cor-de-rosa.

Editoria de Arte/Folhapress
Bactéria detecta câncer

Em outro experimento, o tumor atingido pelas bactérias chegou a encolher –mas esse fenômeno ainda precisa ser melhor estudado pelos cientistas e está longe de se tornar uma técnica médica.

"É uma tecnologia muito poderosa. A principal vantagem é que a bactéria vai especificamente para o tumor. A quimioterapia, por exemplo, vai para todos os lugares do corpo, ataca todas as células que crescem rapidamente, como as do intestino e do seu cabelo."

O MIT tem as patentes das bactérias mutantes. Estima-se que tornar as drogas comercializáveis para humanos tomará ao menos dez anos e US$ 1 bilhão.

BACTÉRIAS NO PRATO

Enquanto esse dia não chega, Danino vai ampliando sua produção em outro campo: as artes visuais.

A responsabilidade por isso é em boa medida do artista brasileiro Vik Muniz.

Eles se conheceram no próprio MIT, quando Muniz procurava maneiras de fazer arte com cientistas.

A parceria com Danino rendeu a série "Colonies", fotografias maximizadas de bactérias e células de câncer, expostas em diversas cidades, incluindo São Paulo em 2014, na galeria Nara Roesler.

Neste ano, os dois criaram pratos para a firma francesa de porcelana Bernardaud. O jogo com sete pratos, um deles com uma imagem ampliada da bactéria Salmonella, custa US$ 550.

"Fazer arte com câncer pode parecer uma ideia maluca, é uma palavra assustadora", disse Danino, que tem uma irmã que sofreu da doença. "Mas queríamos dar um tipo de perspectiva, ser otimista com o futuro das pesquisas de câncer, com as novas tecnologias."


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