Folha de S. Paulo


Instituto carioca tem doutorando de 17 anos e adolescentes no mestrado

Daniel Rocha, 17, está no doutorado. Raúl Chavez, também 17, está por enquanto "apenas" no mestrado, onde é colega de Franco Severo, 19.

Botar adolescentes para fazer pós antes mesmo da graduação é uma estratégia peculiar adotada pelo Impa, o Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada, no Rio.

Alex Argozino/Editoria de Arte/Folhapress
Impa

De lá saiu Artur Ávila, 35, que se tornou no ano passado o primeiro brasileiro a ganhar a Medalha Fields, espécie de Nobel da matemática. Leia a entrevista que ele deu à Folha.

Quando tinha 17 anos, Ávila também já fazia mestrado na instituição. Ele é um entusiasta de começar cedo. Se o aluno tem alto potencial, o que só acontece em "casos específicos", obrigá-lo a fazer a graduação antes do doutorado é uma "bobagem", diz.

Em geral, o Impa recruta os jovens talentos em olimpíadas de matemática promovidas quando os alunos ainda estão na escola. Os professores da instituição tendem a pensar como Ávila: se o aluno consegue acompanhar a pós, não faz sentido esperar. Os alunos ouvidos pela Folha também são entusiastas do mestrado ou doutorado precoce.

"É como tocar piano. Quando antes você começa, mais fácil", diz Alan Anderson Pereira, 22, que acabou de concluir o mestrado.

Há outra coisa que agrada os alunos –a convivência mais próxima de jovens com interesses similares. Muitos desses alunos vêm dos mais variados cantos do país, onde geralmente eram os alunos mais "nerds" das suas turmas. No Rio, em geral passam a morar em repúblicas com outros alunos do Impa.

A grande dificuldade, por outro lado, é lidar com a exigência burocrática de um bacharelado. No Brasil, para que o diploma de mestrado ou doutorado possa ser emitido, é necessário ter feito o curso de graduação.

A solução encontrada pelos alunos é levar a graduação em paralelo. Assim que conseguem concluí-la, já podem emitir o diploma da pós.

Como o Impa não tem cursos de graduação, os alunos se matriculam em outras universidades. A mestranda Maria Clara Mendes, 20, de Pirajuba (MG), estuda na PUC do Rio, por exemplo. "É um pouco complicado, mas dá para conciliar. Só é chato mesmo quando os professores da graduação cobram presença, mas a maioria não faz isso."

O mestrando peruano Raúl Chavez, 17, estuda matemática na FGV do Rio –ele foi o segundo medalhista mais jovem da história da Olimpíada Internacional de Matemática (ganhou um bronze com apenas 11 anos, prata com 12 e ouro com 13). O doutorando Daniel Rocha, 17, acaba de se matricular na UFRJ e também planeja usar seus conhecimentos para "pular as matérias fáceis" da graduação.

Alan Anderson Pereira, que é de Alagoas, também está matriculado na graduação... na federal do seu Estado. Conversando com o coordenador do curso e fazendo alguns ajustes aqui e acolá, faltam agora só três disciplinas para ele se formar.

Com tal contorcionismo para para conciliar graduação e pós, os alunos podem sentir inveja do diretor do Impa, o matemático César Camacho, membro da Academia Brasileira de Ciências.

Camacho fez doutorado na Universidade da Califórnia em Berkeley sem ter graduação. Seu orientador inicialmente havia exigido, mas nada que uma elogiosa carta de recomendação de Elon Lages Lima, patrono da matemática brasileira, não resolvesse.

Camacho depois voltou para o Brasil, fez carreira no Impa e a questão do diploma de graduação ficou por isso mesmo. Segundo Camacho, a exigência de tal documento para a emissão de diploma de doutorado "é um aspecto legal que o Brasil não venceu e que gera situações ridículas".


Endereço da página:

Links no texto: