Folha de S. Paulo


Em versões moderada e truculenta, direita dá as cartas no novo Brasil

Adriana Komura

Definitivamente, 2016 não foi um ano bom para a esquerda brasileira. Em janeiro, o PT governava o Brasil, a cidade de São Paulo e mais 643 municípios.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva já tinha sido abalroado pela Lava Jato, mas pensar que se tornaria réu, e correndo o risco de ser preso, era um grande delírio.

O processo de impeachment de Dilma Rousseff havia sido deflagrado, mas as apostas ainda eram de que escaparia da cassação. Afinal, como não ter míseros 171 votos entre 513 deputados?

João Doria era uma piada, quase um Donald Trump, e o destino certo de ambos, o fracasso nas urnas. No Rio, Marcelo Crivella estava fadado a novamente sofrer o peso da rejeição por ser bispo da Igreja Universal do Reino de Deus.

O novo ano começa com a esquerda e seu principal expoente, o PT, na lona. O vendaval direitista chegou com força avassaladora, rivalizando ou superando a onda vermelha que no início deste século levou Lula ao Palácio do Planalto.

Até pouco tempo atrás radioativo, o discurso do Estado mínimo vestiu-se de cashmere e camisas Ralph Lauren em São Paulo e levou Doria a uma inédita vitória no primeiro turno. O teto de gastos públicos, anátema do discurso desenvolvimentista, triunfou no Congresso.

O que aconteceu? Em parte, o que um dia o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso chamou de "fadiga de material" para explicar sua própria derrocada eleitoral. Em outras palavras, estamos obedecendo ao ciclo normal da política. Democracias maduras são feitas de esquerda e direita em polos opostos de uma roda gigante.

Mas essa não é a história toda. Houve uma mudança palpável de orientação ideológica no país. Palpável, radical e rara. Basta lembrar que, quando o PT assumiu a Presidência, em 2003, tratou de tomar emprestados conceitos que, na época pelo menos, estavam associados à direita, como metas de inflação, superavit primário e câmbio flutuante.

A ordem era fazer uma transição gradual e não bagunçar os cânones econômicos.

Agora é diferente. O que define a política é virar o PT pelo avesso, nas prioridades e nos símbolos, da velocidade nas marginais paulistanas à forma de exploração do petróleo do pré-sal. Na eleição municipal, houve um desfile de candidatos competindo para apresentar-se como o mais antipetista. No plano federal, a guinada só não é mais rápida pela falta de habilidade do novo governo.

A direita soube apropriar-se habilmente do ambiente refratário à política que decorre em grande medida da Operação Lava Jato e do fiasco que foi o governo Dilma. Removida a presidente, o conservadorismo pôde se assumir sem receios.

O PT voltou a ser um partido médio. Governará 85% menos pessoas nas cidades a partir de janeiro de 2017, contra um salto de 89% do PSDB.

Lula, réu do juiz Sergio Moro, parece muito pouco ser uma alternativa viável para disputar a Presidência em 2018. A direita nas suas versões moderada (Geraldo Alckmin) e truculenta (Jair Bolsonaro) dá as cartas. É um novo país.


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