Folha de S. Paulo


SAIU NO NP

Há 20 anos, sertanejo João Paulo morria em acidente de carro

Wanezza Soares-9.set.1997/Folhapress
O cantor sertanejo, João Paulo, morto em acidente de carro em 1997
O cantor sertanejo João Paulo, morto em acidente de carro em 1997

A música sertaneja amanheceu triste na sexta-feira de 12 de setembro de 1997. Naquele dia, um trágico acidente na altura do km 40 da rodovia dos Bandeirantes, no município de Franco da Rocha (Grande São Paulo), interrompeu prematuramente a vida do cantor e compositor José Henrique dos Reis, o João Paulo.

Ao lado de Daniel, formou uma das duplas mais notórias da então nova geração de sertanejos, que passou a triunfar nacionalmente em rádios e TVs durante a década de 1990.

O cantor tinha 37 anos e estava acompanhado do amigo Paulo César Pavarini, que conseguiu sobreviver à tragédia. Ambos seguiam para o município de Brotas (interior de São Paulo), onde João Paulo vivia com a mulher, Roseni Barbosa dos Reis, 27, e a única filha do casal, Jéssica Renata Reis, então com cinco anos -hoje é veterinária.

Pouco mais de duas horas antes do acidente, João Paulo e Daniel haviam acabado de participar da Festa do Peão em São Caetano do Sul (Grande São Paulo). Após a apresentação, a dupla seguiu em carros separados para o hotel onde haviam se hospedado na mesma cidade.

Daniel, que três dias antes havia completado 29 anos, convidou o parceiro para uma comemoração preparada pelo fã-clube.

Mas, desta vez, João Paulo declinou do convite. O anseio em fechar a compra de um imóvel para presentear a mulher e a filha fez com que ele seguisse para Brotas com Pavarini, num sedan BMW comprado havia apenas um mês pelo cantor.

"Ele quase nunca dirigia. Também não costumava voltar para Brotas depois dos shows. Mas, desta vez, queria ver a mulher e a filha", disse ao "Notícias Populares" Lu Barbosa, assessora de imprensa da dupla na época.

Matuiti Mayezo/Folhapress
Destroços do carro do cantor João Paulo, da dupla sertaneja João Paulo e Daniel, após acidente na rodovia dos Bandeirantes em Franco da Rocha (Grande São Paulo)
Destroços do carro do cantor João Paulo, da dupla sertaneja João Paulo e Daniel, após acidente na rodovia dos Bandeirantes em Franco da Rocha (Grande São Paulo)

O ACIDENTE

João Paulo e Pavarini resolveram parar num restaurante, onde compraram cigarros e salgados. Neste momento, o amigo era quem conduzia o BMW. Depois, estacionaram num posto de combustíveis para abastecer. Foi quando João Paulo decidiu assumir o volante.

Após percorrerem cerca de sete quilômetros, passaram pelo primeiro pedágio da rodovia dos Bandeirantes. E, menos de 1 km adiante, ao fazer uma curva, João Paulo derrapou o veículo e perdeu o controle da direção.

Assim como no depoimento de Paulo César Pavarini, o laudo pericial da época apontou que o carro estava a 127 km/h e capotou quatro vezes até cair no canteiro central da pista.

Pavarini conseguiu escapar por uma das portas traseiras da BMW. Já João Paulo ficou preso entre as ferragens e teve seu corpo consumido pelo fogo. O amigo tentou salvar o cantor com um extintor que conseguira emprestado de um caminhoneiro que passava pela rodovia, mas o fogaréu era grande, e a tentativa foi em vão.

O corpo de João Paulo foi levado do local do desastre por volta das 7h com destino ao Instituto Médico Legal de Guarulhos (Grande São Paulo). Às 16h30 foi transferido de helicóptero para Brotas, onde milhares de pessoas aguardavam sua chegada.

Velado na Câmara Municipal de Brotas, por onde passaram cerca de 10 mil pessoas para a última despedida ao cantor –segundo dados da Polícia Militar local–, João Paulo foi sepultado no cemitério municipal de Brotas.

REPÓRTER DO "NOTÍCIAS POPULARES" POR UM DIA

No 33º aniversário do "Notícias Populares", em 15 de outubro de 1996, João Paulo e Daniel foram convidados pelo jornal para serem repórteres por um dia.

Enquanto Daniel cobria um protesto de metalúrgicos em frente ao Ministério da Fazenda, no centro de São Paulo, João Paulo acompanhava o desfecho feliz de uma história trágica.

A entrevista, que durou aproximadamente uma hora, era para contar a história de um policial militar –tido como herói– e uma vítima, que se apaixonaram em meio aos escombros da trágica explosão ocorrida no Osasco Plaza Shopping, em Osasco (Grande São Paulo), na véspera do Dia dos Namorados daquele ano, onde mais de 200 pessoas ficaram feridas.

No fim da entrevista, João Paulo compôs uma música para o casal. Ao terminar a reportagem, o cantor soltou: "Essa vida de jornalista é muito corrida. Prefiro ser cantor".

AS ORIGENS

Filho de lavradores nordestinos que migraram para o interior de São Paulo em busca de sobrevivência, João Paulo nasceu em Brotas em 28 de julho de 1960. Começou a trabalhar cedo em fazendas e também como pedreiro.

Em entrevistas, orgulhava-se em dizer que suas mãos ajudaram a levantar várias casas no município. O cantor chegou a trabalhar para a Prefeitura de Brotas, com asfaltamento de ruas e construção de calçadas.

Desde criança João Paulo se mostrava apto à arte de cantar. Com Francisco, o irmão mais velho, criou a dupla Nero e Nerinho, que se apresentava em circos e festivais realizados em Brotas e cidades vizinhas. Mas a parceria durou pouco. Francisco se casou e decidiu deixar a dupla.

Luzia Ferreira - 13.set.1997/Folhapress
Daniel chora sobre o caixão de João Paulo no dia de seu sepultamento. Credit Luzia Ferreira - 13.set.1997/ Folhapress
Daniel chora sobre o caixão de João Paulo no dia de seu sepultamento

DANIEL

Conhecido em Brotas pela alcunha de "João Pretinho", João Paulo cantou com Daniel pela primeira vez em 1980, num churrasco oferecido na fazenda do pai de Daniel, onde João Paulo trabalhava como cuidador de gado. O patrão gostou tanto do que ouviu que incentivou o filho e o então empregado a formarem uma dupla, que se oficializaria no ano seguinte.

Uma das poucas duplas com um negro como integrante, o primeiro LP, "Amor Sempre Amor" foi lançado quatro anos depois, em 1985, pela Continental.

A consagração e o sucesso, porém, vieram 11 anos mais tarde, em 1996, com o disco "João Paulo e Daniel - Vol.7" (Chantecler), que, além de vender 700 mil cópias, teve duas faixas incluídas em trilhas de novelas da Globo: "Estou apaixonado", versão para "Estoy Enamorado" (Donato e Estefano), em "Explode Coração", e "Pirilume", em "O Rei do Gado".

Um ano antes a dupla havia emplacado a dançante "Eu Me Amarrei". Depois, vieram os hits "Que Dure Para Sempre" (1996) –também gravada pelo grupo de samba Negritude Júnior– e "Ela Tem O Dom de Me Fazer Chorar", dentre outras canções de sucesso.

Após a perda do companheiro, Daniel se firmou numa carreira solo até hoje bem-sucedida. O primeiro show sem o parceiro, no qual prestou uma grande homenagem a João Paulo, foi realizado em 27 de setembro de 1997, na extinta casa de shows Olympia (zona oeste de São Paulo), em cumprimento à agenda da dupla que deixou saudades na música sertaneja.


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