Folha de S. Paulo


12 pontos para entender a crise grega

Após a Grécia não pagar a dívida de € 1,6 bilhão com o Fundo Monetário Internacional (FMI) vencida na última terça-feira (30), a população do país votou no último domingo (5) pelo "não" às condições dos credores para a liberação de verbas.

Isso reforça a legitimidade do primeiro-ministro grego Alexis Tsipras, do partido esquerdista Syriza, para pressionar por um acordo mais vantajoso.

Por outro lado, mantém a preocupação sobre um possível rompimento da Grécia com a zona do euro.

Leia abaixo 12 pontos para entender a crise grega:

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1 - Qual a razão da atual crise?

A Grécia continua tentando desbloquear € 7,2 bilhões, última parte do empréstimo dado por € 240 bilhões de FMI e Banco Central Europeu (BCE).

A verba poderia servir para quitar a parcela de € 1,6 bilhão devida ao FMI —cujo prazo venceu no dia 30— e colocar o país em uma posição melhor para obter novos empréstimos. Os gregos também terão que pagar € 6,7 bilhões ao BCE em julho e agosto.

Após o não pagamento da dívida com o FMI no prazo, aumentou o temor de uma corrida aos bancos que secaria as reservas monetárias do país. Com isso, o governo fechou as instituições até o dia 6 de julho.

Saques em caixas automáticos continuam funcionando, mas com restrições de até € 60 por dia. Bancos foram abertos na quarta-feira da semana passada para aposentados, com limite de saque de € 120 —muitos deles não têm acesso a caixas eletrônicos.

2 - O que significa a opção pelo 'não'?

Ao votar "não" no plebiscito, os gregos decidiram recusar a proposta de acordo feita pelos credores, que exigiam do país aumento de impostos, corte de gastos e reforma profunda no sistema de Previdência para a liberação de verbas.

A escolha pelo não fortalece também o atual premiê Alexis Tsipras (que fez campanha pelo "não").

Uma vitória do "sim" poderia ter significado sua renúncia ao cargo.

Reprodução
Cédula do plebiscito que será realizado na Grécia neste domingo, 5 de julho
Cédula do plebiscito que será realizado na Grécia neste domingo, 5 de julho

3 - O que acontece agora?

A Grécia pode deixar a zona do euro. Seu destino no bloco começa a ser discutido nesta terça (7), em Bruxelas. O encontro foi solicitado pela chanceler alemã, Angela Merkel, e pelo presidente francês, François Hollande. O primeiro-ministro da Grécia, Alexis Tsipras, deve participar.

Nesta segunda-feira, o ministro das finanças grego, Yanis Varoufakis, renunciou ao cargo, no que foi interpretado como uma abertura do governo grego aos credores —Varoufakis vinha adotando um tom agressivo.

4 - Quais as demandas dos credores e o que o governo grego oferece?

Alguns pontos principais têm travado as negociações:

Reforma do IVA (imposto do valor agregado)

Credores querem: que o país arrecade 1% do PIB em 2016.
Grécia propõe: arrecadar 0,74% do PIB em 2016.

Imposto em ilhas

Credores querem: acabar com isenção de 30%.
Grécia propõe: manter o benefício.

Gastos com defesa

Credores querem: corte de € 400 milhões já em 2016.
Grécia propõe: corte de € 200 milhões em 2016 e € 400 milhões em 2017.

Arrecadação em 2015 com reforma da Previdência

Credores querem: que arrecadação seja de 1%% do PIB.
Grécia propõe: que seja de 0,4% do PIB.

Validade das propostas

Credores querem: que comecem valer a partir de julho.
Grécia propõe: validade a partir de outubro.

5 - Qual o tamanho do endividamento grego?

Atualmente, a Grécia tem uma dívida de 177% do PIB —a dívida pública da zona do euro chega, no total, a 91,9% do PIB. São € 320 bilhões.

Grécia

6 - Por que a crise grega parece não ter fim?

A crise da economia grega, como a de outros países europeus, começou em 2008, na esteira da crise americana e ganhou contornos próprios no ano seguinte, quando foi descoberto que o país maquiava as contas públicas e sua dívida, na verdade, era muito maior.

Desde então, apesar dos programas de resgaste (ou por causa deles, segundo seus críticos), a economia não conseguiu engrenar: a taxa de desemprego chega hoje na Grécia a 25,6%.

Mesmo com crescimento de 0,8% da economia em 2014 a demanda é tão fraca que a queda nos preços no país foi de 1,4% em 12 meses terminados em maio deste ano.

Aris Messinis/AFP
Eleitores comemoram a eleição do partido esquerdista Syriza, que ascendeu como alternativa em meio à crise grega
Eleitores comemoram a eleição do partido esquerdista Syriza, que ascendeu como alternativa em meio à crise grega

7 - Bilhões de euros injetados no país não funcionaram. O que os gregos querem agora?

O governo grego fez dois pedidos na última terça (30). O primeiro, já recusado, é que o atual programa de ajuda fosse estendido e os € 7,2 bilhões, liberados.

O dinheiro seria usado para pagar ao funcionalismo e aos credores externos —inclusive a dívida de € 1,6 bi com o FMI.

A segunda proposta é que eles tenham acesso aos fundos do programa europeu de ajuda lançado em 2012. Neste caso, os europeus vão analisar, mas é possível que uma decisão só ocorra após o plebiscito.

Dimitris Michalakis/Vice
A crise econômica prolongada tem levado cada vez mais pessoas vivem a miséria
A crise econômica prolongada tem levado cada vez mais pessoas vivem a miséria

8 - Não seria mais fácil dar logo os € 7,2 bilhões?

Esse dinheiro está congelado há quase um ano, porque os credores exigem que a Grécia cumpra sua parte nas reformas prometidas.

A interpretação é que entregá-lo seria um mau exemplo não só para a Grécia, mas também para outros países, que futuramente poderiam, à base de ameaças, receber dinheiro sem entregar as contrapartidas.

Odd Andersen/AFP
Lagarde, à esquerda, e Merkel, à direita, chanceler da Alemanha, um dos países credores da Grécia
Lagarde, à esquerda, e Merkel, à direita, chanceler da Alemanha, um dos países credores da Grécia

9 - Sem dinheiro, como a Grécia vai pagar ao funcionalismo, a aposentados e a fornecedores?

Essa é uma dúvida que deve ser resolvida nas próximas semanas. Uma hipótese é que ele emita algum tipo de título (o governo da Califórnia fez isso em 2009) com a promessa de pagamento futuro.

Esses papéis costumam ser aceito no comércio, mas com alguma forma de deságio.

Dimitris Michalakis/Vice
Aposentados viram pensões encolherem e as economias da vida inteira evaporarem. A maioria vive em pobreza absoluta
Aposentados viram pensões encolherem e as economias da vida inteira evaporarem

10 - Criar uma nova moeda resolveria a crise econômica da Grécia?

Com a criação de uma nova moeda há o risco de um aumento desenfreado de preços, desabastecimento, incentivo ao mercado negro e empobrecimento do país.

A Grécia seria forçada a sair da zona do euro —e, segundo alguns analistas, até mesmo da União Europeia, reduzindo a confiança na união monetária do continente.

Ficaria para trás o bloco monetário construído ao redor da moeda comum, criado em 1999.

Ele é controlado pelo Banco Central Europeu, e conta com 19 países membros, com 337 milhões de habitantes —11 milhões deles, gregos.

11 - Quais os riscos da crise para o Brasil?

O ministro Joaquim Levy afirmou na última terça (30) que o país está "relativamente confortável" para enfrentar o calote grego.

Além do impacto nos mercados financeiros, um risco para o Brasil é se os problemas gregos se espalharem para o resto da União Europeia, já que o bloco compra quase 20% das exportações brasileiras.

Paulo Whitaker/Reuters
Levy: O Brasil está 'relativamente confortável' para enfrentar o calote grego
Levy: O Brasil está 'relativamente confortável' para enfrentar o calote grego

12 - Pretendo viajar para a Grécia. Devo desistir?

Apesar da promessa do governo de que a restrição a saques não afetará estrangeiros, agências recomendam que turistas levem dinheiro vivo.


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