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Sem limpeza da baía de Guanabara e obras, Olimpíada terá legado mirrado

Ana Carolina Fernandes/Folhapress
Vista aérea da baía de Guanabara, palco de competições da Olimpíada do Rio
Vista aérea da baía de Guanabara, palco de competições da Olimpíada do Rio

Oito anos de preparativos antecederam os 17 dias de competições olímpicas no Rio de Janeiro, que acontecem entre 5 e 21 de agosto. Da lista de promessas feitas, e que ajudaram o Brasil a ganhar a candidatura em 2008, poucos projetos de impacto vão melhorar a vida na cidade.

Dentre as frustrações, está o plano de despoluição da baía de Guanabara, local das disputas de vela. O documento de candidatura do Brasil assinado por João Havelange que, à época, era membro decano do COI (Comitê Olímpico Internacional), se comprometia a tratar 80% do esgoto que deságua na baía antes do início dos Jogos.

Apesar da falha em cumprir a meta, para a APO (Autoridade Olímpica Brasileira) é preciso olhar os avanços. "Houve ampliação de 10% para 50% no nível de tratamento de esgoto na área da baía", diz Marcelo Pedroso, presidente da APO.

A SEA (Secretaria de Estado do Ambiente) culpa o modelo de gestão. "A baía possui vários gestores e nenhum planejamento em comum visando a sua recuperação e preservação", respondeu em nota à Folha.

Um novo plano de governança está sendo elaborado para que "erros do passado não se repitam e a baía não fique mais à mercê da gestão de um período de governo". A secretaria preferiu não falar em prazos.

MAR DE SUJEIRA - Estações de saneamento na Baía de Guanabara operam abaixo da meta do governo fluminense

Ainda assim, a qualidade da água durante as competições não estaria comprometida, afirma Pedroso. A solução foi criar uma galeria de cintura que "desviou" o esgoto despejado na área da Marina da Glória para mais longe, o emissário submarino de Ipanema.

Para os 9 milhões de habitantes do entorno da baía, quase nada mudou. "O problema da poluição da Guanabara é o esgoto da baixada fluminense. E as obras ali ficaram muito aquém do prometido", avalia Rogério Valle, professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e coordenador do relatório de impactos e legados do Jogos Rio 2016.

Dawid Bartelt, diretor da Fundação Heinrich Böll Brasil, que estuda os impactos de megaeventos esportivos, não vê um legado promissor: "Com os Jogos concluídos, nenhuma grande melhoria deve acontecer nos próximos anos, até porque o estado do Rio beira a falência." Em 20 anos de Programa de Despoluição da Baía de Guanabara foram gastos R$ 2 bilhões.

Como parte da estratégia para diminuir as emissões de CO2 na área de transporte, a construção das 4 linhas de BRT (Transporte Rápido por Ônibus) ainda não está 100% concluída. "Tudo foi feito em função do funcionamento dos Jogos, e não da população", critica Bartelt.

A entrega da linha 4 do metrô, que ligará Ipanema à Barra da Tijuca, também ficou para depois dos Jogos. Já o VLT (Veículo Leve sobre Trilho) deve entrar em operação parcial até agosto, ligando a região da rodoviária ao aeroporto Santos Dumont.

Depois de calcular a emissão de carbono dos Jogos, estimada em 3,6 milhões de toneladas de CO2, o Comitê Rio 2016 criou uma ferramenta online que poderá ser usada gratuitamente em eventos futuros. "É importante saber o tamanho da pegada de carbono dos eventos. A ferramenta fica como legado", disse Tania Braga, gerente de sustentabilidade do Comitê.

Os projetos de compensação dessas emissões são feitos em parceria com a Dow, empresa química e patrocinadora do evento. Na gestão de resíduos, catadores vão atuar junto com o Comitê. "A ideia é incentivar as pessoas a fazer a separação correta do lixo e mostrar como isso ajuda o ambiente e o catador."

Um ano após o megaevento, um novo estudo vai analisar o legado das Olimpíadas, sob o comando de Rogério Valle. "Será o momento de ver se os Jogos foram, de fato, uma ocasião de mudança na cidade."


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