Folha de S. Paulo


Otimista com o Brasil, Vargas Llosa diz que país 'não está vivendo um caos'

Fabio Braga/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL, 12-05-2016: Vargas Llosa durante sua fala. O Instituto Palavra Aberta promove no Insper palestra com o jornalista e escritor vencedor do Premio Nobel da Literatura, Mario Vargas Llosa. O autor peruano discorre sobre sua trajetoria, liberdade de expressao e liberdade politica. (Foto: Fabio Braga/Folhapress, FOTO).
O Nobel da literatura Mario Vargas Llosa, 80, durante palestra no Insper

Estimulado pelo ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, a comentar a situação brasileira, o escritor peruano Mario Vargas Llosa, 80, disse que existe hoje um descolamento da política da sociedade, não apenas no Brasil.

"A política deixou de atrair os melhores e os mais capazes. Estes preferem dedicar-se a suas carreiras e a ganhar dinheiro. A política virou algo sujo e decadente. É preciso seduzir os jovens com talento a fazer da política algo criativo e enriquecedor."

Fabio Braga/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL, 12-05-2016: O ex-Presidente do Supremo Tribunal Federal do Brasil, Joaquim Barbosa, faz pergunta ao escritor Vargas Llosa durante evento. O Instituto Palavra Aberta promove no Insper palestra com o jornalista e escritor vencedor do Premio Nobel da Literatura, Mario Vargas Llosa. O autor peruano discorre sobre sua trajetoria, liberdade de expressao e liberdade politica. (Foto: Fabio Braga/Folhapress, FOTO).
O ex-Presidente do STF, Joaquim Barbosa, faz pergunta ao escritor Vargas Llosa durante evento

O comentário de Barbosa, que estava na plateia da palestra que o Nobel deu na noite de quinta-feira (12), no Insper, em São Paulo, foi de que "o Brasil assistiu nas últimas semanas o espetáculo de uma encenação que exemplifica a falta de sinceridade absoluta dos nossos representantes".

O autor de "Lituma nos Andes", porém, retrucou que, apesar do que ouviu nos últimos dias, nessa estada no país, "o Brasil não está vivendo um caos". Isso porque, segundo o escritor, a ideia de "uma grande mobilização como a que houve nos últimos tempos, por uma democracia menos corrupta, só pode trazer otimismo. Se vê um desejo de purificação das instituições no Brasil. Como isso não vai ser positivo?"

Vargas Llosa também relacionou a crise de representatividade no Brasil com um fenômeno mais amplo e mundial. "A globalização trouxe efeitos positivos mas também está provocando a disseminação de pequenas seitas. Muita gente tem se assustado com o que é diferente, e quer ficar com o que conhece."

E deu o exemplo da Europa, onde vive há muitos anos (na Espanha). Apesar de considerar a União Europeia um projeto ambicioso e que trouxe paz e prosperidade a um continente que "tinha um passado de guerras monstruosas", hoje se vê em risco por conta da disseminação de sectarismos e nacionalismos, "um impulso por voltar às tribos".

Acrescentou que a possível saída do Reino Unido da União Europeia será prejudicial para ambos os lados.

Perguntado sobre o fenômeno dos refugiados vindos da Síria e de outros locais de conflito, Vargas Llosa relacionou a recusa de muitos europeus em aceita-los como um dos efeitos desse "renascimento dos nacionalismos" provocado pelo medo.

"Mas é preciso que os europeus entendam que essas migrações são, em primeiro lugar, uma homenagem ao estilo de vida europeu. E depois, que admitir imigrantes não é apenas um ato generoso, mas uma necessidade vital porque, sem os imigrantes, os europeus não têm como garantir sua qualidade de vida."

Acrescentou, ainda, que é necessário haver uma visão mais matizada do mundo árabe por parte do Ocidente. "Temos de entender que as primeiras e principais vítimas do fundamentalismo são os próprios muçulmanos."

O escritor comentou, ainda, a eleição peruana, que terá seu segundo turno no próximo dia 5 de junho e na qual a filha do ex-ditador Alberto Fujimori – adversário que derrotou Vargas Llosa nas eleições à presidência em 1990 – lidera as pesquisas.

Guadalupe Pardo/Reuters 3.abr.2016
Peru's presidential candidate Keiko Fujimori gestures as she arrives for a presidential debate in Lima, Peru, April 3, 2016. REUTERS/Guadalupe Pardo ORG XMIT: LIM14
Keiko Fujimori chegando para um debate em Lima

"Uma coisa curiosa sobre as ditaduras é que elas deixam um rabo, um grupo de nostálgicos", disse, fazendo com que a plateia desse risada. Mas acrescentou que uma vitória de Keiko Fujimori seria uma catástrofe para o Peru, por que o fujimorismo foi uma ditadura sanguinária, que "destruiu as instituições, perseguiu e abusou dos direitos humanos".

Sua mais recente novela, "Cinco Esquinas", que sai no Brasil nos próximos meses, trata do modo como o fujimorismo utilizou a imprensa sensacionalista para destruir reputações dos opositores ao regime.


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