Folha de S. Paulo


Análise

Ação contra políticos traz desafios à Lava Jato

A Operação Lava Jato começou a avançar concretamente no mundo político, e não são poucos os desdobramentos que serão vistos nas próximas semanas.

Tecnicamente, a Polícia Federal nem considera as ações desta terça-feira (14) como parte oficial da Lava Jato —as famosas "fases". Recorre a Platão para propugnar a busca pela ética na Operação Politeia, mas a ideia mesmo é dar identidade própria às apurações envolvendo políticos, que já vinham ocorrendo na forma de depoimentos.

Mas uma operação midiática muda o patamar da coisa. Na prática, o que se viu quando os carros de luxo do senador e ex-presidente da República Fernando Collor de Mello (PTB-AL) foram levados para fora da Casa da Dinda hoje foi também uma sinalização de que políticos não necessariamente escaparão das investigações.

Até aqui, o foco principal da Lava Jato foi a relação entre empresários e a Petrobras —não são poucos os que criticam o foco excessivo em empreiteiros, supondo uma narrativa segundo a qual a estatal foi vítima e ignorando o papel preponderante de integrantes da empresa na montagem do esquema criminoso.

Políticos, ainda que tenham sido levados à berlinda na primeira leva de pedidos de inquérito da PGR (Procuradoria-Geral da República), só começaram a ser tocados agora, na operação desta terça.

Resta saber, claro, até onde o tumultuado colegiado Justiça Federal-Ministério Público Federal-Polícia Federal irá chegar. Os alvos até aqui atingidos são de peso médio para baixo na política, sem naturalmente fazer quaisquer julgamentos de mérito —todos se dizem inocente, naturalmente.

Apesar do rigor demonstrado até aqui, interesses complexos e pressões mais ou menos difusas impossibilitam saber se o "doa a quem doer" prometido pelo chefe da PF, Leandro Daiello, de fato ocorrerá.

CUNHA

Em Brasília, é dado de barato que o todo-poderoso presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), estará na nova leva de denunciados pela PGR, em muito breve. Para seus aliados, trata-se de uma vingança do procurador-geral, Rodrigo Janot, duramente criticado por Cunha e pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) —outro investigado na Lava Jato.

Todos negam irregularidades, no caso dos acusados, ou motivações políticas, no caso de Janot.

Na lógica do grupo de Cunha, como precisa cacifar-se para sua campanha de recondução ao cargo em setembro, Janot teria um "peixe graúdo" para mostrar para seu público interno e para o Planalto. Dilma Rousseff é, afinal, quem decidirá se ele continua no cargo.

Contra isso, além da necessidade de comprovação da teoria pela realidade, há o óbvio. A pressão inicial feita sobre Renan transformou um antigo aliado num visceral e complicado adversário. Cunha sempre se pautou por um jogo mais calculado nas suas disputas com o Planalto e o PT, e como inimigo ferido e aberto poderia trazer ainda mais problemas para o governo.


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