Folha de S. Paulo


Financiadores corporativos corroem fidelidade partidária, diz estudo

O financiador de campanha pode ter mais peso sobre o parlamentar do que o Executivo e a orientação partidária em votações de seu interesse no Congresso, segundo pesquisa apresentada nesta quarta-feira (29) no encontro anual da Anpocs (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais).

Intitulado "O Financiamento de Campanha e Apoio Parlamentar à Agenda Legislativa da Indústria na Câmara dos Deputados", o estudo analisou 11.286 votos nominais dos parlamentares entre 1999 e 2007. As votações envolviam 22 matérias legislativas em que a CNI (Confederação Nacional da Indústria) tinha uma posição definida previamente.

"O compromisso de campanha que o deputado tem com determinados grupos de financiamento altera a relação com o Executivo e a ideologia", afirma o cientista político Manoel Santos (UFMG), coautor do estudo, junto com Mariana Batista, Dalson Britto e Enivaldo Rocha, todos da UFPE.

Segundo Santos, enquanto a média das votações revela uma alta fidelidade partidária e alinhamento com governo federal, o mesmo não ocorre em recortes específicos, que envolvem interesses dos financiadores de campanha. "Há um financiamento da indústria a deputados para que eles cooperem quando necessário. Quanto mais dependente do financiamento corporativo, mais está disposto a cooperar."

"A indústria aprova mais de 60% de suas matérias. É uma taxa muito alta, em parte porque tem objetivos compartilhados com o Executivo, como desenvolvimento econômico e produtividade. Mas tem pontos conflitantes: relação entre capital e trabalho e tributação, por exemplo", afirma.

Questionado sobre como deveria ser o financiamento de campanha no Brasil, Santos defende a criação de um teto para contribuição das empresas. "Com esse teto de financiamento, um setor específico não poderá mandar no mandato do parlamentar. Isso combinado com o financiamento público que já existe no Brasil."

Santos defende ainda que as doações sejam feitas exclusivamente por cartões corporativo, de crédito ou de transferência bancária, o que ajudaria no controle da origem do dinheiro. "Hoje, as doações são feitas por mais de 60 mil CNPJs, fica impossível fiscalizar. O eleitor vota sob o véu da ignorância."


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