Folha de S. Paulo


Após depredação em ato, especialistas divergem sobre responsabilizar MPL

O último protesto promovido pelo MPL (Movimento Passe Livre), na quinta-feira (19), terminou com agências bancárias e concessionárias de veículos depredadas. A Polícia Militar afirmou que o movimento é culpado pela destruição, pois promoveu o ato e fez um acordo para que o policiamento permanecesse distante. Já especialistas ouvidos pela Folha divergem quanto às responsabilidades.

O advogado especialista em direito público Anis Kfouri concordou que o Movimento Passe Livre pode ser responsabilizado pelas depredações. "Quem causa o dano deve repará-lo. Como o Passe Livre se comprometeu por meio de documento, como diz a polícia, a se organizar e garantir segurança, deve ser responsabilizado", disse.

O jurista comparou um protesto a outros eventos de grande porte promovidos na cidade. "Quando há uma marcha evangélica ou micareta, os organizadores pedem aos órgãos públicos para fechar vias. Eles fazem um cordão de isolamento e contratam seguranças para garantir segurança e controle dos participantes. A partir do momento em que você incita um protesto sem tomar uma medida minimamente preventiva, você é responsável pelos possíveis danos", disse Kfouri.

Segundo ele, mesmo a manifestação sendo um direito constitucional, não pode se sobrepor ao direito à vida. "A entidade deve prever as possíveis consequências de cada ato quando o convoca, pois há inclusive a chance de alguém morrer, como o cinegrafista no ano passado. O Passe Livre terá de provar que não é responsável pelo ato caso seja responsabilizado judicialmente", disse.

Editoria de Arte/Folhapress

Já para o sociólogo Rodrigo Ghiringhelli, professor da PUC-RS e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o movimento não pode ser responsabilizado pela depredação. "[A culpa] não é deles, pois me parece que não há por parte do Passe Livre nenhuma ideia de que a depredação possa contribuir com suas reivindicações. Há pessoas infiltradas ou grupos que tenham outra estratégia que não representam a do movimento, que inclusive tenta estabelecer acordos com a polícia."

Segundo ele, a atuação da polícia deve ser investigada e revista para os próximos atos. "Era esperada uma ação mais preventiva da polícia. Houve de fato uma omissão que não pode ser explicada apenas com base nesse acordo. Se espera que em uma outra oportunidade a polícia tenha uma preocupação maior de que, ao garantir a manifestação, também evite que pessoas se aproveitem de ações como essa para cometer crimes", disse.

Para Ghiringhelli, a justificativa da polícia em ter ficado longe dos manifestantes por haver um acordo é frágil. "A polícia tem que atuar de forma preventiva, evitando acessos a determinados locais e identificando grupos que possam cometer vandalismo. De fato, não dá para entender como 500 policiais não conseguiram manter o controle de um protesto com 1.300 pessoas."

O ato reuniu cerca de 1.300 pessoas e começou de forma pacífica na avenida Paulista. Na marginal Pinheiros, porém, quando a maior parte dos manifestantes deixava a via para encerrar o ato no largo da Batata, mascarados promoveram depredações por ruas da região.

O secretário de Segurança Pública, Fernando Grella, também criticou a ação da PM durante o ato e disse que a atuação da corporação foi falha e contrária à orientação da pasta. Já o governador Geraldo Alckmin (PSDB) afirmou que a ação da polícia durante manifestações terá de ser revista.

EX-COMANDANTE

A estratégia policial causou estranheza até entre quem já liderou a corporação. O vereador em São Paulo Alvaro Camilo (PSD), que foi comandante-geral da PM paulista por três anos, disse que a polícia deve negociar, mas também colocar a tropa em locais em que seja possível intervir.

"A partir do momento em que começarem a quebrar, deve haver intervenção policial, independente de acordo. Ao que vi, eles [policiais] estavam um pouco longe [quando a concessionária foi depredada]", disse.

Camilo também comandou do batalhão da região central, responsável pela maioria das grandes manifestações, por dois anos e disse que nunca fez acordo semelhante ao feito entre a PM e o Passe Livre. "Eu negociava com manifestantes para discutir trajetos e o que poderia ser feito durante o ato, mas quando quebravam a ordem, a gente fazia prisões", afirmou.

Para ele, o movimento também deve ser responsabilizado pelos danos promovidos durante o ato. "O Movimento Passe Livre tem culpa porque foram eles que convocaram [o ato] e assumiram o risco. A única coisa que eu discordo, pelo que vi na TV, é que a Polícia Militar deveria intervir assim que começassem as depredações."

PROTESTO


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