Folha de S. Paulo


Defesa de Dirceu recorre ao plenário do STF contra veto a trabalho externo

A defesa do ex-ministro José Dirceu, condenado no julgamento do mensalão, entrou nesta sexta-feira (16) com um recurso para que o plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) analise o pedido do petista para deixar o presídio em Brasília e trabalhar durante o dia em um escritório de advocacia.

Na semana passada, o presidente do STF, Joaquim Barbosa, negou a solicitação. O ministro disse que o petista não cumpriu um sexto da pena para poder obter o benefício, apontando que a oferta de emprego a Dirceu foi um arranjo entre amigos.

Os advogados subiram o tom e classificaram a decisão do presidente do Supremo como "equivocada, ilegal, isolada", e que extrapola questões jurídicas.

"Não se trata de evidentemente de um trabalho de fachada, ou de uma suposta troca de favores. Não há espaço para opiniões pessoais em decisões judiciais, principalmente quando não se encontram respaldadas em qualquer elemento dos autos", afirma o texto assinado por quatro juristas.

Condenado no processo do mensalão a 7 anos e 11 meses de prisão, Dirceu cumpre pena desde novembro e pediu para trabalhar no escritório de José Gerardo Grossi com salário de R$ 2.100.

Por ter a pena inferior a oito anos, Dirceu tem direito ao regime semiaberto, que é quando o preso sai para trabalhar durante o dia e retorna à noite para a cadeia, desde que autorizado pela Justiça.

Cabe ao presidente do Supremo decidir quando o novo pedido da defesa será submetido aos outros ministros. Ainda não há prazo.

Ao negar o pedido de Dirceu e revogar a autorização de trabalho externo para mais três condenados do mensalão, Barbosa utilizou o entendimento de que é preciso cumprir um sexto da pena para requerer o trabalho externo, como determina a Lei de Execução Penal.

Desde 1999, o Superior Tribunal de Justiça adotou o entendimento de que a exigência do cumprimento de um sexto da pena vale só para presos em regime fechado. Para o presidente do STF, porém, essa regra desvirtua a lei.

A defesa de Dirceu defende a orientação do STJ. Os advogados alegam que o Código Penal não estabelece o cumprimento de um sexto da pena para presos no semiaberto e que essa determinação é prevista apenas para condenados a regime fechado, acima de oito anos de pena.

Para os advogados, a decisão de Joaquim Barbosa impossibilita o trabalho externo no regime semiaberto, sendo "ilógico".

"Enxergar tal exigência [temporal] onde ela não existe, equivaleria a adicionar imposições gravosas e ilegais ao apenado, impedindo-o de exercer seu direito ao trabalho externo da forma como positivado", afirmam.

"A valer esse ilógico entendimento, na prática, o trabalho externo deixa de existir no regime semiaberto. Mostra-se equivocada, portanto, a conclusão a que se chegou o ministro Joaquim Barbosa quando afirmou que o STJ tornou o trabalho externo a regra do regime semiaberto equiparando-o ao regime aberto", completam.

A defesa ainda rebateu o argumento de Barbosa de que não seria possível fiscalizar o cumprimento de trabalho de Dirceu porque o dono do escritório não ficaria o tempo todo no local e disseram ter sido ofensiva a interpretação do magistrado de que Grossi ofereceu trabalho a Dirceu por amizade.

"Não há aqui qualquer evidência de uma tentativa de ludibriar a Justiça, como quer fazer crer o ministro Joaquim Barbosa", diz a ação.

RESISTÊNCIAS

O entendimento de Barbosa enfrenta resistência de três ministros do STF ouvidos pela Folha sob a condição de anonimato. Na avaliação deles, Barbosa fez uma interpretação delicada da lei, alterando uma medida que virou praxe em todo o país.

De acordo com um dos magistrados, o presidente do STF está na contramão da orientação da Justiça de promover a ressocialização do preso e de reduzir a população carcerária.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, também defendeu que não é preciso o cumprimento de um sexto para a autorização de trabalho externo para condenados a semiaberto.


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