Folha de S. Paulo


Editorial

Desmate estancado

Bruno Kelly/Reuters
Área devastada na Amazônia é alvo de operação do Ibama em julho deste ano

O governo Michel Temer (PMDB) comemora a redução de 16% na área desmatada da Amazônia durante a temporada 2016-17, após dois anos de alta. José Sarney Filho (PV-MA), ministro do Meio Ambiente, atribuiu a queda a ações de fiscalização de órgãos federais.

Foram derrubados 6.624 km² de floresta amazônica, contra 7.893 km² no período anterior (agosto de 2015 a julho de 2016). Um ano antes se devastaram 6.207 km², cifra semelhante à ora anunciada.

Há muito o que qualificar no número divulgado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que faz o levantamento com imagens de satélite. Cabe assinalar, primeiro, que o último dado ultrapassa em 540 km² o quádruplo da área do município de São Paulo.

Por positivo que seja ocorrer redução, não aumento, como nos dois intervalos anteriores, não há tanto motivo para comemorar. Desde que o Inpe iniciou o monitoramento, há quase três décadas, um quinto da área florestada na Amazônia brasileira sofreu corte raso.

Os 6.624 km² de 2017 podem parecer um progresso diante dos 27.772 km² de 2004, mas representam quase o dobro dos 3.500 km² de destruição máxima que o Brasil se comprometeu a alcançar até 2020.

O desmatamento e a agropecuária, que lhe serve de impulsionador, são a maior fonte das emissões de carbono brasileiras (noutros países, elas derivam da indústria e do setor de energia). Parece hoje improvável, assim, que o país consiga cumprir a meta de redução assumida no Acordo de Paris para mitigar o aquecimento global.

De todo modo, repita-se que é auspicioso haver queda no desmate. Deve-se encarar com cautela, entretanto, a reivindicação de eficiência das ações de comando e controle patrocinadas pelo governo federal por meio do Ibama.

Se é verdade que a autarquia teve parte de seu orçamento recomposto com recursos do Fundo Amazônia, de modo a manter as imprescindíveis ações de fiscalização, igualmente é fato que as restrições orçamentárias do ministério e de outras repartições federais não serão superadas tão cedo.

Cabe também ao Planalto e aos ocupantes da Esplanada considerar a explicação alternativa aventada por vários especialistas: ao lado das operações do Ibama, teria sido decisivo ainda o recuo nos preços da proteína bovina.

Após a Operação Carne Fraca e alguns reveses do produto brasileiro no mercado internacional, pecuaristas estariam com menos recursos para custear o desmate.

Há, portanto, o que saudar na notícia, mas com certa parcimônia.

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