Os ingredientes são de um filme de espionagem inspirado nos tempos da Guerra Fria: um grupo de hackers (pessoas especializadas em acessar ilegalmente sites ou sistemas digitais públicos e privados) violou redes informatizadas dos dois principais partidos políticos norte-americanos para capturar documentos e e-mails.
Os "Dukes", como os invasores são conhecidos, usaram parte das informações a fim de interferir na eleição que culminou com a vitória do republicano Donald Trump.
A peculiaridade da trama é que por trás dessas ações, segundo evidências reunidas pelo serviço de inteligência americano, está o governo da Rússia. Constatou-se também que os hackers orquestraram vazamento seletivo do material com o intuito de prejudicar a campanha da democrata Hillary Clinton.
Apenas os dados subtraídos do Comitê Nacional Democrata foram entregues a plataformas de divulgação de informações confidenciais, como WikiLeaks.
Trump reagiu às primeiras informações, divulgadas pela CIA, classificando-as de ridículas. A tentativa de envolver o caso na bruma das teorias conspiratórias e do rancor dos derrotados, todavia, não prosperou.
Representantes do próprio Partido Republicano manifestaram-se a favor de investigações e consideraram o tema de interesse nacional e suprapartidário.
Ninguém acredita que a intromissão externa teve papel relevante no resultado. É grave, contudo, a flagrante tentativa de um governo de imiscuir-se na mais importante decisão eleitoral de outro.
Sabe-se que, na guerra cibernética, agências de espionagem dos mais diversos países -incluídas, obviamente, as norte-americanas- usam hackers para invadir sistemas e obter informações.
O episódio da eleição dos EUA, no entanto, tem dimensão planetária e é agravado pelas declarações de simpatia entre Trump e o presidente da Rússia, Vladimir Putin.
Como esperado, Putin nega que tenha participado dos ataques, mas o governo Barack Obama já estuda represálias.
A ação dos hackers, bem como a divulgação intencional de notícias falsas nas redes sociais, serve de alerta para essa nova e indesejável modalidade de interferência no processo democrático.
A espionagem eleitoral, entretanto, não tem em si nada de novo. Basta lembrar, para não sair dos Estados Unidos, que o mesmo Comitê Nacional Democrata já havia sido violado por métodos tradicionais -e por agentes internos- há 44 anos, quando se localizava no complexo Watergate.