Folha de S. Paulo


opinião

Armando Castelar: Governança dos projetos de infraestrutura no Brasil

Como conciliar as medidas de ajuste fiscal e de combate à inflação com uma agenda para a aceleração do crescimento do Brasil e melhoria de sua competitividade? Seja qual for o caminho, ele passa por um substancial aumento do nível de investimento, sobretudo em infraestrutura.

A formulação de novas concessões e de parcerias público-privadas (PPP) é um caminho viável. Tal medida agregaria massivos investimentos privados, com uma velocidade muito maior do que a de uma obra pública. Os aeroportos federais concedidos em 2011 são bons exemplos do potencial deste instrumento.

O modelo de concessões e de PPPs apresenta outras vantagens, permitindo uma melhor alocação dos riscos dos projetos entre o público e o privado, facilitando a fiscalização (são definidos parâmetros de desempenho e penalidades para o seu descumprimento) e estabelecendo incentivos para a busca de eficiência e de qualidade, aproveitando a maior flexibilidade e agilidade de atuação do setor privado.

No entanto, inúmeras barreiras dificultam a maior utilização desse instrumento no Brasil, dentre as quais destacam-se a dificuldade dos governos oferecerem garantias, as ineficiências tributárias (há cobrança de impostos sobre o faturamento das concessionárias) e as limitações legais e gerenciais dos órgãos reguladores.

Outra questão importante é a limitação do mecanismo de manifestação de interesse (PMI), onde o governo autoriza o setor privado a executar estudos para o desenvolvimento de um projeto de interesse público. Segundo um levantamento realizado pelo portal PPP Brasil, com dados sobre PMIs estaduais entre 2007 e 2012, apesar do um aumento da utilização desse instrumento, a taxa de sucesso foi muito baixa.

Dos 65 PMIs analisados, apenas 6 foram licitados. Todos eles com apenas um participante habilitado (não coincidentemente, aquele que elaborou o estudo), impedindo a captura dos ganhos advindos de uma concorrência para o projeto.

O modelo da PMI provoca um conflito de interesses. De um lado, os potenciais licitantes, que prepararam o projeto na expectativa de maximizar o retorno do seu investimento. Do outro, o governo, que precisa resguardar o interesse público, a qualidade do serviço e a modicidade tarifária.

Além disso, como a autorização para os estudos não pode ser exclusiva, os governos podem se ver assoberbados com a quantidade de estudos entregues, que precisam ser avaliados e, eventualmente, combinados. Por exemplo, no projeto de iluminação pública da Prefeitura de São Paulo, foram apresentadas 11 modelagens distintas.

Isso reduz a chance de cada empresa vencer e torna muito arriscado o negócio de elaboração dos projetos (pois as empresas arcam com elevados custos, sem garantia de ressarcimento), gerando ineficiências ao longo do processo.

A solução passa pela adequação da legislação relacionada a PMI, bem como por uma maior participação de empresas independentes na estruturação de projetos –entendidas como aquelas que não têm interesse em participar do leilão, sendo, portanto, um ente neutro no processo.

Um exemplo dessa natureza é a Estruturadora Brasileira de Projetos (EBP Brasil), formada para esta finalidade por bancos de investimento nacionais, e que apoiou o poder público na concessão 17 projetos de grande porte, entre eles 5 aeroportos e 8 rodovias federais, com uma média de 4,8 participantes por leilão. São evidências de que a formação de um mercado de consultorias independentes parece ser um caminho adequado.

ARMANDO CASTELAR é Coordenador de Economia Aplicada do IBRE/FGV e Professor do Instituto de Economia da UFRJ. É autor de "Além da Euforia: Riscos e Lacunas do Modelo Brasileiro de Desenvolvimento" (Ed. Elsevier, 2012), em co-autoria com F. Giambiagi, e "Rio de Janeiro, um Estado em Transição" (FGV Editora, 2012), co-organizado por Fernando Veloso

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