Folha de S. Paulo


Análise

Mulheres são postas de lado e Xi Jinping ocupa o centro do palco

O presidente Xi Jinping anunciou nesta semana o início de uma "nova era" para a China. Mas até agora essa era oferece poucas novidades para as chinesas.

Na quarta-feira (25), depois de uma semana de discursos e elogios ao presidente, o Partido Comunista Chinês anunciou os nomes de seus membros que vão liderar o país nos próximos cinco anos.

Em uma cerimônia do Grande Salão do Povo, no lado oeste da Praça Tiananmen, Xi, hoje considerado o líder mais poderoso desde Mao Tsé-tung e Deng Xiaoping, atravessou o palco com membros do órgão supremo do partido, o Comitê Permanente do Politburo.

Entram Xi Jinping, Li Keqiang, Li Zhanshu, Wang Yang, Wang Huning, Zhao Leji, Han Zheng —todos homens.

Entre os 25 membros do Politburo, o segundo órgão mais elevado, agora há uma mulher, contra duas anteriormente. O Comitê Central do partido, com 204 membros, é novamente agraciado por dez mulheres.

Mao ficou famoso por dizer que "as mulheres sustentam a metade do céu". Mas aqui são apenas 4,9%.

Deveríamos ficar surpresos com isso? Sim e não.

Jason Lee - 11.nov.2016/Reuters
China's Politburo Standing Committee member Sun Chunlan attends a conference commemorating the 150th birth anniversary of Sun Yat-Sen, widely recognised as the father of modern China, at the Great Hall of the People in Beijing, China, November 11, 2016. REUTERS/Jason Lee/File Photo ORG XMIT: TPE41
Sun Chunlan, única mulher no Politburo, em evento do partido comunista chinês em 2016

A China, segundo sua própria Constituição, está comprometida com os direitos das mulheres. O país se orgulha de ser um líder em redução de pobreza, em saúde e educação.

Enquanto as mulheres chinesas estão, em média, mais ricas, mais educadas e mais saudáveis que antes, especialistas dizem que elas estão perdendo terreno em relação aos homens, por exemplo, com uma diferença salarial que se amplia.

Os ganhos em participação política não se transferiram para os principais papéis de liderança.

Nas seis décadas desde que os comunistas chegaram ao poder, em 1949, nenhuma mulher foi nomeada para o órgão superior do partido.

De 2012 a 2017, o Politburo teve duas mulheres —os cargos mais elevados desde que as mulheres de dois líderes ganharam lugares em 1969.

Xiong Jing, diretora-executiva da organização não-governamental Vozes Feministas, em Pequim, disse que os números deste ano são "revoltantes", mas "não surpreendentes".

"Há muito tempo temos esse problema da baixa representatividade das mulheres na política e, ao contrário de outros campos, não estamos vendo sinais de progresso", disse ela.

Xiong explicou que ter mais delegadas mulheres não traria necessariamente a igualdade de gêneros, mas que é altamente improvável que uma liderança majoritária masculina faça disso uma prioridade.

"É de fato um problema", afirmou ela.

Rumando para seu segundo mandato de cinco anos, Xi tem um histórico sobre as mulheres decididamente misto.

Em 2015, cinco feministas chinesas foram detidas enquanto planejavam um ato de protesto pacífico para marcar o Dia Internacional da Mulher.

Meses depois, Xi fez um discurso na Conferência das Mulheres na ONU em Nova York, prometendo "reafirmar nosso compromisso com a igualdade de gêneros e o desenvolvimento das mulheres".

Maya Wang, uma pesquisadora sênior na Human Rights Watch em Hong Kong, disse que há várias maneiras de o governo fazer isso.

"A primeira coisa que o governo chinês pode fazer é aprovar uma antidiscriminação abrangente na lei do emprego, que deveria incluir uma ampla definição de discriminação", disse ela.

O governo também deve "desenvolver e promover novas políticas que deem às empresas incentivos para contratar mais mulheres".

Se Xi pretende abordar os direitos das mulheres nos próximos cinco anos, não disse realmente isso.

Em seu discurso de três horas e meia, a situação da mulher teve apenas algumas menções superficiais. Um trecho citou brevemente a necessidade de proteger as mulheres e as crianças.

Em uma passagem sobre a disciplina no partido, ele tocou na necessidade de "cultivar e selecionar membros femininos". Mas não mencionou por que sua representação em cargos graduados caiu nos cinco anos de seu mandato.

Essa é a questão. A China está longe de ser a única no que se trata de governar através de homens, excluindo as mulheres. Mas se Xi é o líder todo-poderoso que afirma ser, e realmente quisesse incluir as mulheres, elas estariam lá.

Vendo os números, é seguro supor que ele não quer.

Lan Hongguang/Xinhua
Xi Jinping cumprimenta membros do Partido Comunista chinês, composto majoritariamente de homens

Tradução de LUIZ ROBERTO MENDES GONÇALVES


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