Folha de S. Paulo


ANÁLISE

História da Espanha moderna é marcada por atos de terrorismo

Josep Lago/AFP
Policemen check the identity of people standing with their hands up after a van ploughed into the crowd, killing two persons and injuring several others on the Rambla in Barcelona on August 17, 2017. A driver deliberately rammed a van into a crowd on Barcelona's most popular street on August 17, 2017 killing at least two people before fleeing to a nearby bar, police said. Officers in Spain's second-largest city said the ramming on Las Ramblas was a
Policiais na região atingida pelo ataque terrorista que foi reivindicado pelo Estado Islâmico em Barcelona

A mais recente expressão do terrorismo, o atropelamento de inocentes, chegou nesta quinta (17) ao mesmo endereço no qual o termo foi usado por uma das primeiras vezes como o conhecemos hoje, no fim do século 19.

Em 7 de novembro de 1893, um anarquista jogou duas bombas na plateia que assistia ao segundo ato da ópera "Guilherme Tell" no magnífico Gran Teatre del Liceu –localizado na Rambla, cenário das mortes em Barcelona. Uma delas explodiu, matando cerca de 20 pessoas.

O atentado foi o primeiro de muitos que atingiriam a Espanha, isso sem contar a troca de atrocidades entre os "brancos" de Francisco Franco e os republicanos "vermelhos" durante a Guerra Civil (1936-1939). São atribuídas ao lado vencedor, fascista, de 60 mil a 400 mil mortes até o fim da ditadura, em 1975. Aos esquerdistas, de 38 mil a 72 mil.

Mas o terror promovido por grupos subnacionais ganhou corpo com o surgimento do ETA, uma organização que visava a independência das áreas de maioria basca na Espanha e França, nos anos 60.

O grupo, que tinha apoio de agremiações análogas como o IRA norte-irlandês, matou 486 membros de forças de segurança e 343 civis de 1968 até depor armas em 2011 –um processo que só acabou oficialmente neste ano.

Suas ações ocorriam majoritariamente na capital, Madri, e na região do País Basco. Barcelona foi atingida ocasionalmente, com um grande incidente: o bombardeamento de um supermercado em 1987, com 21 mortos.

O ETA cometia todo tipo de assassinato, mas sua marca registrada eram os carros-bomba. Só em Madri, foram 37, com 121 mortos. O Ministério do Interior espanhol contabiliza cerca de 3.300 ataques, que também deixaram 2.000 feridos.

O terror islâmico visitou a Espanha pela primeira vez ainda nos anos 1980. A explosão de uma bomba no restaurante El Descanso, frequentado por militares americanos em Madri, matou 18 pessoas. A autoria foi atribuída ao grupo xiita libanês Jihad Islâmico, mas ninguém chegou a ser preso.

Mas foi a ascensão da Al Qaeda que marcou a história de sangue dos atentados da Espanha. A rede do terrorista saudita Osama bin Laden (1957-2011) surgiu em 1988, mas ganhou fama mundial pelos ataques do 11 de setembro de 2001 em Nova York e Washington.

Ela fez sua estreia em Madri num outro dia 11, em março de 2004. No começo da manhã, dez artefatos explodiram de forma coordenada em quatro trens lotados na malha ferroviária urbana. Morreram 192 pessoas, com pouco mais de 2.000 feridos.

Além do custo humano, houve baixas políticas também. O governo do conservador Partido Popular, que apoiava a guerra que os EUA travavam desde 2003 no Iraque, era favorito para reeleger-se em eleições gerais marcadas para três dias depois dos ataques.

Como sugeriu inicialmente que o ETA estava por trás dos atentados, o premiê José María Aznar foi acusado de tentar evitar a associação entre seu apoio à guerra e os terroristas islâmicos. Resultado: perdeu a eleição para os rivais socialistas.

O passado da região alimenta o imaginário de muitos jihadistas, que sonham com Al Andalus. De 711 a 1492, a Espanha sediou esse poderoso califado. No auge, os muçulmanos dominaram quase toda a Península Ibérica, e o processo de reconquista por parte dos cristãos foi central para a cristalização das identidades nacionais espanhola e portuguesa.


Endereço da página:

Links no texto: