Folha de S. Paulo


Espanhóis vão às urnas na eleição mais incerta desde o retorno da democracia

Preocupados com corrupção e desemprego, espanhóis vão às urnas neste domingo (20) participar de eleições que podem ser históricas.

Neste pleito, o poder será disputado por quatro forças políticas, em vez dos dois partidos que vêm se revezando no comando há décadas, praticamente desde o retorno da Espanha à democracia.

Se o PP (Partido Popular, conservador) e o PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol, de centro-esquerda) acumularam quase 75% dos votos nas eleições de 2011, desta vez deverão se contentar com menos da metade.

Assim, quem quer que vença neste pleito –provavelmente o PP, segundo pesquisas eleitorais– terá que, no dia seguinte, buscar seus rivais para formar um governo.

"Continuaremos com o bipartidarismo, mas em percentuais muito menores", diz à Folha José Ignacio Torreblanca, diretor do escritório madrilenho do Conselho Europeu de Relações Exteriores. "Ainda que PP e PSOE continuem majoritários, abriram um imenso espaço político onde entraram outras forças."

O abismo eleitoral foi preenchido pelos partidos Podemos, de esquerda, e Cidadãos, de centro-direita, ambos liderados por políticos jovens e carismáticos.

Pierra-Philppe Marcou - 7.dez.2015/AFP
Leader of Spanish Socialist Party (PSOE) Pedro Sanchez (L), leader of left wing party Podemos Pablo Iglesias (2nd L), center-right party Ciudadanos leader Albert Rivera (2nd R) and Vice President of the Spanish government and Partido Popular PP's number two on the Madrid list for the upcoming December 20 general election, Soraya Saenz de Santamaria (R) pose before participating in an electoral TV debate organized by Antena 3 television at San Sebastian de los Reyes, near Madrid on December 7, 2015. AFP PHOTO / PIERRE-PHILIPPE MARCOU ORG XMIT: PPM1282
Da esq. para a dir., Pedro Sanchez (PSOE), Pablo Iglesias (Podemos), Albert Rivera (Cidadãos) e Soraya Sáenz de Santamaria (PP), antes de debate na TV

MUDANÇA DE CAMPANHA

O surgimento de novas forças levou os veteranos a apostar por campanhas mais próximas dos eleitores, com forte presença na televisão -não apenas em debates e entrevistas, mas também nos programas de variedades.

O PSOE, renovado com a escolha do candidato Pedro Sánchez, 43, tentou se distanciar do passado: as primeiras medidas de austeridade, com cortes dos gastos sociais, foram adotadas em 2010, durante o governo de José Rodríguez Zapatero.

O PP tentou contrabalançar o desgaste da figura do premiê Mariano Rajoy, 60, dando espaço na campanha para sua vice, Soraya Sáenz de Santamaría, 44. Mas o dano já parece irreversível.

DECLÍNIO DO BIPARTIDARISMO - Estimativa de voto, em %

A legenda é prejudicada por escândalos de corrupção e pela persistência do alto desemprego -ainda em 21,2%, apesar da recuperação da economia espanhola, que deve crescer 3% neste ano.

No momento mais tenso da campanha, um debate televisivo cara a cara entre Rajoy e Sánchez, o candidato do PSOE acusou o rival de não ser "um homem decente" e disse que ele deveria ter renunciado quando veio à tona o caso Bárcenas.

O ex-tesoureiro do PP Luis Bárcenas confessou ter administrado o caixa dois que o partido teria mantido durante quase 20 anos, recolhendo doações ilegais de empresas que tinham contratos com o governo e distribuindo propinas a dirigentes. Rajoy nega ter recebido dinheiro.

O PSOE, por sua vez, "ficou na metade do caminho", segundo o analista Torreblanca.

"É um pouco de esquerda e um pouco de centro. Isso pode ser útil, quando disputa apenas com o PP, mas, ao competir com outros partidos, os eleitores podem escolher outras opções mais de esquerda ou mais de centro."

PROJEÇÃO DE ASSENTOS

INDECISOS

Diante de um cenário mais plural, os eleitores têm mudado sua intenção de voto e, segundo algumas pesquisas, um quarto deles estava indeciso dias antes do pleito.

"O resultado eleitoral está muito em aberto, ainda que isso se dê pelo fato de que os dois novos partidos serão a chave para a governabilidade", diz Marta Romero, do instituto Fundación Alternativas.

RESULTADO EM 2011

Rajoy, contando com a vitória, já procurou o Cidadãos para oferecer parceria -a proposta já foi recusada.

Para o cientista político Jorge Galindo, os novos partidos criaram um cenário de muita incerteza. "A maneira mais eficaz de um eleitor imaginar o que um partido fará no poder é olhar o que fez antes. Nem Podemos nem Cidadãos têm esse passado para ser comparado", diz.

A lei eleitoral impede pesquisas desde a última terça-feira (15), o que, num quadro de muita volatilidade, pode ajudar a trazer surpresas.


Endereço da página:

Links no texto: