Folha de S. Paulo


Lisboetas acusam gangues do Leste Europeu de furtos

Moradores de bairros de classe média alta de Lisboa, capital de Portugal, vêm atribuindo assaltos às suas casas a ações de gangues do Leste Europeu –suspeita corroborada, embora não oficialmente, por integrantes da polícia.

O modus operandi dos assaltos inclui arrombamento de portas e janelas, furto de joias e objetos de valor que sejam impossíveis de rastrear e sumiço de itens femininos de luxo –lingerie, cremes, perfumes, bolsas ou sapatos.

"Não levam nada que possa ser rastreado. Deixam os computadores, os tablets, qualquer coisa que tenha número de série ou GPS", diz sobre os crimes um técnico de análise forense, que pediu para não ser identificado.

Suspeita-se que as casas sejam invadidas por mulheres, que entregariam joias e objetos de valor aos homens da gangue e ficariam com os demais itens dos assaltos.

Moradora do bairro lisboeta de Telheiras, Fátima –nome fictício, como o de todas as vítimas de furtos neste texto– chegou a cruzar com as assaltantes ao voltar à sua casa, ainda à luz do dia. Só ao entrar no apartamento percebeu que ele fora revirado.

Em agosto, o jovem casal Maria e João retornou mais cedo de um fim de semana após ser avisado por familiares de que a porta do apartamento havia sido arrombada. Todas as joias desapareceram, junto com pares de sapatos, bolsas de grife, casacos e perfumes femininos.

"Vejam se não faltam lingerie ou cremes hidratantes", pediu a polícia técnica ao casal enquanto procurava recolher impressões digitais.

Outro casal, Luís e Inês, teve roubadas uma câmera fotográfica, uma caixa de relógios e joias de família usadas no casamento, há três anos, ou recebidas em ocasiões especiais, como final de curso e noivado. Os assaltantes entraram pela janela, de dia.

ESTATÍSTICAS

Apesar da sensação de insegurança na capital, as autoridades portuguesas não divulgam os números dos crimes atribuídos às gangues, e o total de assaltos com arrombamento no país diminuiu.

Em termos nacionais, no primeiro semestre de 2014, foram registradas 3.735 denúncias de assaltos a casas com arrombamento. No mesmo período de 2013, foram 4.070, 9% a mais. Ainda assim, o número é considerado alto para os padrões de Portugal, país cuja taxa de homicídios por 100 mil habitantes é 1/25 da verificada no Brasil.

Segundo dados da Eurostat (a central de estatísticas da União Europeia), em um período mais longo (de 2003 a 2012), os assaltos a casas portuguesas subiram 14%.

No mês passado, 90 pessoas acusadas de pertencer a uma rede de assaltos a residências foram detidas na Espanha por uma força policial multinacional.

Em setembro, o Ministério Público português acusou formalmente 28 pessoas de integrar uma associação de fachada para encobrir lucros de € 350 mil (cerca de R$ 1 milhão) com assaltos a residências.

PRECONCEITO

A alegada influência de imigrantes do Leste Europeu no aumento da criminalidade na Europa Ocidental vem sendo debatida desde 2011, com países como Holanda, França e Bélgica defendendo que levar o assunto a discussão no Parlamento Europeu.

Holandeses chegaram a criar um site para acolher denúncias contra imigrantes. Em 2014, o governo do Reino Unido anunciou ações para conter o afluxo de romenos e búlgaros, que passaram a ter o direito de buscar emprego em qualquer país da União Europeia a partir deste ano.

Em Lisboa, moradores levantam suspeitas de que diaristas vindas de países como Ucrânia, Romênia e Moldávia, que imigraram em razão da crise na região, participem dos assaltos. Segundo a polícia, furtos foram facilitados por funcionários das casas.

Algumas das diaristas do Leste Europeu com quem a Folha falou, e que também preferem não ser identificadas, se queixam de preconceito dos patrões e de que, depois de tantos anos vivendo em Portugal, não possam ser consideradas como iguais.


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