Folha de S. Paulo


Estado Islâmico usa hashtags para publicar vídeos e driblar restrições

Propagandistas do Estado Islâmico (EI) estão pegando carona em hashtags e fóruns populares na internet para garantir a distribuição mais ampla possível de seus vídeos, num jogo cada vez mais complicado de gato e rato com a polícia e as empresas da internet.

Uma análise de uma das mais recentes distribuições de vídeo do EI revela a diversidade de técnicas empregadas para aumentar a distribuição dos materiais extremistas no Twitter e YouTube, incluindo pegar carona em um tema que gerou interesse enorme, como o plebiscito sobre a independência da Escócia.

As estratégias sofisticadas usadas levaram órgãos policiais a cooperar mais estreitamente que nunca com as maiores empresas mundiais de tecnologia e mídia social, para tentar vencer a guerra de propaganda.

Um esquadrão de polícia especializada britânica está trabalhando com empresas que incluem o Twitter e o YouTube para bloquear e deletar cerca de 1.100 obras por semana de conteúdo sinistro que, segundo a polícia, infringe as leis antiterror do Reino Unido. A grande maioria dos materiais -800 itens por semana-diz respeito à Síria e ao Iraque.

Editoria de Arte/Folhapress

Agentes da unidade de contraterrorismo na internet do Reino Unido (CTIRU) reconhecem que enfrentam uma disseminação ágil e hábil de propaganda. Boa parte do contra-ataque envolve a suspensão de contas do Twitter e tirar do ar vídeos de assassinato, tortura, ataques de atiradores e missões suicidas.

Um exemplo foi visto na semana passada. Uma das unidades de produção de mídia do EI, al-Furqan, lançou seu primeiro vídeo no que descreveu como uma série de "programas", mostrando o fotojornalista britânico sequestrado John Cantlie trajando macacão laranja, sentado atrás de uma escrivaninha e falando para várias câmeras.

A al-Furqan também é responsável por vídeos de outros sequestrados, James Foley, Steven Sotloff e David Haines, cujas execuções tenebrosas foram filmadas e disseminadas na internet. Na terça-feira, horas depois de os EUA bombardear alvos do Estado Islâmico no Iraque e Síria, o grupo pôs no ar um segundo vídeo com Cantlie.

Usando serviços de postagem de conteúdos, sites de colagem de textos e múltiplas contas de Twitter de backup, agentes do EI fugiram dos controles dos administradores, espalhando o vídeo de Cantlie pela Web em questão de horas. Nos minutos antes de seu lançamento, agentes do EI lançaram tuites dando um sinal a seus seguidores.

Uma conta, que usa o nome @with_baghdadi, aconselhou as pessoas a ter pelo menos duas contas de backup para o caso de suspensão, perguntando: "Vocês estão prontos?"

Enquanto eram carregados no YouTube, os links para o filme também eram colocados no serviço justpaste.it, que virou um elemento vital da máquina de divulgação do EI porque permite que os usuários postem imagens e textos de modo anônimo.

A partir do site, as pessoas podiam descarregar a mensagem em vídeo de Cantlie a partir de três outros sites -gulfup.com, sendspace.com e directmirror.com-, depois de digitar uma senha comprida, também fornecida na página da justpaste.it.

Os grupos jihadistas entenderam que precisam alcançar certo nível de distribuição muito rapidamente. Se seus conteúdos não forem disseminados a tempo e depositados em centenas de lugares, eles sabem que poderão ser controlados mais facilmente pelos funcionários do Twitter e YouTube.

Outro agente de divulgação do EI, Abdulrahman al-Hamid, pediu a seus 4.000 seguidores no Twitter que informassem os maiores "trending topics" no Reino Unido e nomes populares de contas nas quais pudessem pegar carona. Escrevendo em árabe sob o nome agora suspenso @Abu_Laila, ele escreveu:

"Precisamos que nos deem os hashtags mais ativos no Reino Unido. E também as contas das celebridades mais famosas. Acho que o hashtag da separação da Escócia do Reino Unido deve ser o primeiro."

As respostas aconselharam o uso dos hashtags #andymurray, #scotland, #scotlandindependence, #VoteNo e #VoteYes e links para o nome de Twitter de David Cameron.

"Por favor façam um esforço para divulgar todos os links", Hamid pediu. Ao mesmo tempo, @With_baghdadi recomendava aos partidários do Estado Islâmico que "invadissem" os hashtags #voteno "com o vídeo do prisioneiro britânico".

Outro agente do EI, Abu Omar al-Fateh, atiçou o YouTube, dizendo: "O YouTube começou a deletar alguns dos links para o novo vídeo. Queremos dizer a vocês, administradores do YouTube, que dentro em breve vamos lhes enviar uma nova leva de links!".

O CTIRU está ativamente procurando materiais extremistas e pedindo ao público que encaminhe a ele quaisquer materiais que lhe causem preocupação. No ano passado a unidade instigou a retirada de circulação de mais de 45 mil materiais.

Uma porta-voz disse que a polícia tem boas relações com as empresas de internet relevantes mas que, onde necessário, também vai fazer uso da legislação apropriada dos países em questão para barrar a divulgação de mensagens e vídeos violentos.

As medidas tomadas pela polícia e agências de segurança parecem estar tendo um impacto. Após o expurgo de contas de jihadistas promovido pelo Twitter na semana passada, Hamid tuitou em 14 de setembro: "Falamos muito sobre a deletação de contas e sobre maneiras de permanecer firmes e incentivar as pessoas a seguir adiante mesmo que suas contas sejam deletadas ou suspensas. Temos que reconhecer que isto é um desastre e precisamos ter paciência."

Durante a operação para divulgar o vídeo de Cantlie, Hamid repreendeu seus seguidores: "Àquele que se preocupa com a possibilidade de sua conta ser suspensa, digo: 'Juro por deus que há outros que se dispõem a sacrificar-se por sua religião. Você deve se envergonhar por sua conta ser atacada, mesmo dez vezes.'"

Respondendo a perguntas do "Guardian", Fateh, parabenizado online por ter carregado o vídeo de Cantlie no YouTube dez vezes, negou-se a dar detalhes sobre os métodos da al-Furqan. Falando pelo Twitter, disse que a equipe da al-Furqan tem "longos anos de experiência". Ele não confirmou nem negou fazer parte do grupo.

Em alguns casos, funcionários do Twitter parecem estar suspendendo contas de backup assim que são ativadas, mesmo que as novas contas não tenham infringido normas.

Uma conta operada por Rayat al-Tawheed, que fala em nome de combatentes pró-EI principalmente de origem britânica, teve uma conta substituta deletada pelo Twitter minutos depois de ser relançada, na terça-feira, quando tinha lançado apenas três tuites não ofensivos.

O Twitter se negou a revelar detalhes específicos de sua operação, dizendo: "Revemos todas as contas denunciadas à luz de nossas normas, que proíbem uso ilegal e ameaças violentas".

Tradução de CLARA ALLAIN


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