Folha de S. Paulo


Análise: Histeria em torno de bebê real reforça apoio aos republicanos

E assim termina uma boa semana para os republicanos britânicos. Você pode imaginar que o nascimento de um futuro rei de um popular casal real seria uma catástrofe para os anti-monarquistas, mas aparentemente não é bem assim. O grupo República, que exige uma alternativa democrática aos Windsors, afirma ter recebido milhares de pedidos de filiação, além de atenção sem precedentes nas mídias sociais.

"É um mito que grandes eventos reais sejam ruins para os republicanos", diz Graham Smith, presidente do grupo. "Muito antes pelo contrário. Esses eventos - o casamento, o jubileu da rainha - são inflados desproporcionalmente pela mídia e a forma como ela os retrata não reflete a opinião pública. A maior parte das pessoas olha a cobertura do nascimento e fica se perguntando para quê tanto estardalhaço. Elas querem que isso pare. "

Se podemos confiar nas estatísticas, um a cada quatro leitores deve concordar com Smith. Outro dos quatro deve cuspir seu café da manhã em protesto apoplético. Mas cerca de metade dos britânicos não tem opiniões fortes a respeito, nem para um lado, nem para o outro.

O República estima que haja entre 10 e 12 milhões de republicanos na Grã-Bretanha - seus dez mil seguidores no Twitter sugerem que a cifra é otimista -, mas, independentemente dos números, os indivíduos que concordam com esse ponto de vista ficaram na mão na semana passada.

Um jornal dedicou 21 páginas ao bebê real anônimo na terça, e depois classificou a cobertura da BBC como exagerada. No programa "BBC Breakfast", o nascimento foi saudado como um triunfo para a marca britânica. Até o Guardian disse ter tido audiência recorde em seu blog ao vivo sobre os eventos em torno do nascimento.

Seria incorreto, também, classificar o nascimento como uma mera preocupação paroquial. A primeira página do "Le Matin", da França, estampou um "C'est un garçon!" ("É um menino!") e a maior parte da mídia do mundo deu proeminência à notícia, incluindo pesos-pesados como o New York Times, que chamou isso de um espetáculo diferente de qualquer outro da idade moderna da mídia. Uma pesquisa mostrou que havia mais fascínio com o bebê na Índia do que no Reino Unido.

Agora que a histeria se dissipou e as câmeras do mundo inteiro foram embora, é um momento apropriado para fazer o balanço. Será que a chegada do príncipe George nos disse alguma coisa que já não soubéssemos sobre nossas atitudes a respeito de monarquia, classe e parto? Além disso, será que aprendemos algo sobre o status britânico no mundo em 2013?

Temos uma situação agora em que a família real britânica está se tornando a família real global, argumenta Tristram Hunt, historiador e parlamentar trabalhista no centro da Inglaterra. Eles chegaram a um status muito mais alto do que o das famílias reais espanhola, holandesa ou japonesa.

Isso se deve em parte a Diana e em parte à forma como o mundo vê a Grã-Bretanha agora. A família real significa história, legado e uma visão britânica. Eles atingiram status de celebridades globais. Isso é bom? Claro, a família real é muito tradicional, mas a imagem é a de um casal jovem, fotogênico, feliz, moderno e confortável, diz Hunt. Não parece uma má imagem para o país.

Smith, do República, discorda. "Isso fez mal à nossa reputação no mundo, porque não reflete a Grã-Bretanha como nós somos", ele diz. "O problema, quando se fala com pessoas de outros países, é que muitas vezes eles pensam que somos um país obcecado pela tradição, que ama a família real, e onde tudo é muito antigo e tal. Na verdade, somos um país incrivelmente moderno, vibrante e empolgante, com uma economia inovadora e empreendedora. Isso se perde completamente nesses eventos - é muito triste."

No final da semana passada, quando William, Kate e George se retiraram com a família em Berkshire, tudo era normal no local do nascimento real. No pátio do hospital St. Mary, em Paddington, no oeste de Londres, a família Burt posava para fotos. "Esperávamos mais pessoas, especialmente aqui", disse Sarah Burt, a mãe. No palácio de Buckingham, uma mãe e uma filha, Geertje Hans e Marit Swart, da Holanda, pareceram um pouco desapontadas quando ouviram a pergunta sobre se os Windsors eram agora a família real do mundo. "Mas nós temos a nossa", respondeu Hans.

Ela reconheceu, porém, que havia algo distinto na monarquia britânica. "Eu diria que a nossa é mais próxima do povo e a daqui é mais formal. Lá, se você vê a rainha Beatrix na rua, pode apertar sua mão. Eles não são pessoas especiais. Não imagino que aqui eu poderia cumprimentar o príncipe Charles".

Claro que, para muitos britânicos e estrangeiros, é justamente o fato de que a família real é intocável que lhes garante o charme. Na era das celebridades de reality show, eles representam uma alternativa refinada, eterna e anacrônica.

O acréscimo de Kate Middleton ao elenco - uma plebeia, como frequentemente somos lembrados - trouxe consigo uma dinâmica intrigante. Ela é perfeita, mas não de maneira ameaçadora; mesmo logo depois do trabalho de parto, ela se dirigiu à imprensa com o cabelo imaculadamente cuidado, em cascatas de mechas.

É para manter o perfil enigmático da família real - e dos seus assessores de relações públicas - que ainda não saibamos nada de interessante ou importante sobre o nascimento de George. Mesmo após horas de cobertura na TV e infinitas páginas de análises em jornais, os detalhes são vagos. É em parte por isso que a mídia mergulhou na perfumaria. Nos disseram, por exemplo, que Middleton usava um vestido desenhado por Jenny Packam no primeiro dia. George inicialmente usava um conjunto de 12 libras da aden+anais, antes de uma rápida troca de guarda-roupa para um xale de batismo da GH Hurt and Son de 45 libras.

Certamente a maior parte de nós, seja lá o que pensemos sobre o bebê, acreditamos que é hora de ir adiante. O único grupo que tem interesse na continuidade da saga é o dos republicamos. "Não digo que estejamos à beira de uma revolução", observa Smith, do República, "mas o movimento está em sua melhor forma desde a luta pelo sufrágio universal".


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