Folha de S. Paulo


Pesadelo da crise econômica de 1998 assombra os russos

Elena recorda a crise de 1998, quando o rublo, a moeda local, despencou e destruiu a poupança de milhões de russos, e teme que o tumulto que afeta a divisa hoje possa ser ainda pior.

"Meus colegas e eu passamos horas no supermercado, para formar estoques. Estamos apavorados com a possibilidade de que a inflação continue a disparar", disse a contadora.

"Lembro-me da crise de 1998, mas desta vez vai ser muito pior porque o mundo está contra nós", ela disse, aludindo às sanções impostas pelo Ocidente à Rússia por causa da crise com a Ucrânia.

O embargo, somado à forte queda dos preços do petróleo nas últimas semanas, foi um pesado golpe para a confiança na economia da Rússia, e despertou memórias da crise de 1998, quando o rublo desabou e o governo decretou moratória nos pagamentos da dívida pública.

Os preços do petróleo caíram praticamente à metade de julho para cá, o que puxou o tapete das finanças do governo, já que as exportações de energia respondem por 50% da arrecadação no país.

O banco central russo disse nesta segunda-feira (15) que o PIB pode se contrair em até 5% no ano que vem se os preços mundiais do petróleo continuarem no nível atual –em torno de US$ 60.

O rublo vem sendo arrastado pela queda do preço do barril do petróleo e acumula desvalorização de mais de 50% neste ano.

Yulia, 43, que dirige um salão de beleza em São Petersburgo, disse que agora está à beira da falência, porque o salão depende de produtos italianos. "Não consegui dormir a noite toda, pensando sobre o que fazer."

Em Moscou, Igor afirmou que "tenho medo de que os preços subam, o preço dos carros, da comida. Sabemos muito bem que não há como substituir as importações. Isso é um mito".

A Rússia proibiu a importação de produtos alimentícios da União Europeia e dos EUA, em uma represália às sanções ocidentais, agravando a situação porque produtos de outros países em muitos casos se provaram mais dispendiosos.

CONFIANÇA EM PUTIN

A despeito do tumulto nos mercados, que vem causando ondas de choque em todo o mundo e despertando questões sobre a saúde das economias de mercados emergentes, os russos ainda acreditam que seu presidente, Vladimir Putin, resolverá a crise.

"Sim, existe inflação [de 9,1% em novembro, em 12 meses, a mais alta em três anos], mas sabemos que Putin não tem escolha. Sua popularidade não sofrerá", disse Dmitry Briliyev, 35, osteopata que vive em Moscou.

"Não estou preocupada", disse Olga, 24. "Temos Putin, ele resolverá tudo."

A crise "não mudará nada no apoio ao presidente", afirmou Irina Istomina. "Não temos outros líderes e os russos estão acostumados a viver sob seu punho de ferro", acrescentou.

Alexei, 27, enquanto isso decidiu lucrar com a crise produzindo camisetas com frases irônicas sobre o rublo.

"Sobrevivemos à queda da União Soviética, à crise de 1998. Estamos acostumados a que as coisas vão mal e sabemos que sobreviveremos até ao pior", disse o empresário, que vende suas camisetas em euros.


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