Folha de S. Paulo


Opinião: Japão prova ser melhor aposta de crescimento que os mercados emergentes

Muitos investidores admitem prontamente que a bolha mundial de crédito está se desinflando, mas eles ainda não alteraram seus investimentos básicos apesar disso.

Muitos deles ainda conferem às ações de mercados desenvolvidos peso inferior ao dos ativos relacionados a crédito. Mercados emergentes, imóveis, commodities, ouro, fundos de hedge e capital privado apresentaram desempenho significativamente superior ao das ações durante a bolha, porque essas categorias de ativos eram mais sensíveis à criação de crédito e à demanda superestimulada. Todas as grandes categorias de ativos relacionadas ao crédito vêm apresentando desempenho inferior ao das ações desde que a bolha começou a se desinflar.

Os investidores ainda assim se apegam às categorias de ativos sensíveis ao crédito na esperança de que elas venham de novo a apresentar desempenho superior à média. Em alguns casos, tais como no dos ativos alternativos, os investidores elevaram suas alocações. Essa lentidão no reconhecimento de que a liderança nos mercados financeiros está mudando sugere que as ações podem continuar bem atraentes, a despeito de já estarem apresentando desempenho superior ao do mercado.

Uma das maiores oportunidades na economia mundial pós-crédito são as ações japonesas, porque o Japão tem o potencial de ganhar competitividade diante dos mercados emergentes. Os observadores das ações japonesas tendem a se concentrar nas políticas do primeiro-ministro Shinzo Abe, mas essas análises podem estar desconsiderando uma questão ainda maior e mais favorável.

CAPACIDADE EXCEDENTE ACUMULADA

As bolhas criam capacidade que deixa de ser necessária quando a bolha de desinfla, e a bolha mundial de crédito não foi exceção. Imensa capacidade produtiva foi criada em muitos países emergentes, sob a suposição de que o crescimento nesses mercados se aceleraria. As projeções se provaram incorretas, e a capacidade excedente está se acumulando, com o recuo da bolha do crédito.

Capacidade excedente resulta em concorrência em termos de participação de mercado e preços, nas commodities. Muitos estudos recentes destacaram que o crescimento da produtividade mundial está se desacelerando. Na ausência de avanços na produtividade, os países que desejam ganhar mercado precisam fazê-lo agora pela desvalorização de suas moedas.

O iene forte tornava difícil para as companhias japonesas concorrer, dadas as tendências demográficas do país e sua baixa produtividade. O Japão agora está promovendo uma queda artificial do iene que pode permitir preços mais competitivos para seus produtos. O iene caiu em 33% ante seus picos mais recentes diante do dólar, e em cerca de 40% diante do euro.

O Japão pode ter vantagem considerável sobre os mercados emergentes, à medida que se intensifica a disputa por participação de mercado. Uma consequência da depreciação cambial é a inflação, e a inflação está de fato se acelerando no Japão. Mas uma inflação mais alta é muito mais positiva para o Japão do que seria para outras economias, porque os japoneses passaram por muitos anos de deflação. A inflação anual média de 1999 à metade de 2013 foi de menos 0,3%.

Mesmo com a desvalorização significativa do iene, a taxa de inflação japonesa continua a ser de apenas 1,6%. Os deficit em conta corrente e uma continuada falta de inflação significativa sugerem que o Japão ainda tem causa e flexibilidade consideráveis para desvalorizar ainda mais o iene.

Os mercados emergentes não têm a mesma flexibilidade cambial que o Japão. Os grandes mercados emergentes têm hoje os maiores índices de crescimento da base monetária e inflação. A inflação é de pelo menos 3% anuais na Índia, Indonésia, Turquia, Rússia, Brasil, África do Sul e outros.

A ESTRATÉGIA FUNCIONA

A estratégia do Japão para ganhar participação de mercado pode estar começando a funcionar. Uma grande companhia japonesa recentemente anunciou que estava transferindo alguma produção dos mercados emergentes de volta ao Japão. É óbvio que esse dado se refere a apenas uma companhia, mas seria fácil que isso se tornasse tendência, à medida que o iene continua a se desvalorizar e se inquietação civil e instabilidade política continuarem a dominar as notícias sobre os mercados emergentes.

Os exportadores japoneses poderiam se beneficiar dessa mudança de ambiente. Mas uma estratégia simplista como essa pode não obter sucesso tão grande quanto o que seria possível caso os esforços para evitar que companhias exportem produtos incompletos para a cadeia de suprimentos asiática tenham sucesso. Companhias cujo foco é a demanda final, e não produtos intermediários, podem se sair melhor.

As estimativas de rendimento dos analistas talvez estejam começando a refletir a vantagem competitiva incipiente do Japão. A perspectiva de crescimento de lucros para as empresas é de 17% para o Japão, ante 12% para os mercados emergentes como um todo e apenas 8% para os países do grupo BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China).

As projeções seculares quanto a lucros também começam a favorecer o Japão. Para o Japão, a projeção de lucro empresarial de longo prazo é de um crescimento de 15%, ante 12% para os mercados emergentes e 14% para o grupo BRIC.

O Japão oferece uma história de crescimento melhor que os mercados emergentes. Os investidores podem encontrar vantagem em abandonar os líderes do passado e aceitar as realidades da economia mundial pós-bolha.

RICHARD BERNSTEIN é presidente-executivo e vice-presidente de investimento da Richard Bernstein Advisors

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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