Folha de S. Paulo


Dólar tem maior preço em cinco meses; Bolsa cai quase 2% por China

Dados decepcionantes de produção industrial da China aumentaram entre os investidores a cautela com mercados emergentes e causaram uma baixa generalizada das Bolsas nesta quinta-feira (23).

As notícias também tiveram impacto entre as principais moedas emergentes e fizeram com que o dólar atingisse o maior patamar em cinco meses ante o real.

O Ibovespa, principal índice da Bolsa brasileira, fechou em baixa de 1,98%, aos 48.320 pontos. No mês, o índice acumula perda de 6,19%.

A queda foi motivada pela retração da produção industrial do país asiático em janeiro. Foi a primeira retração em seis meses.

A pesquisa Índice de Gerentes de Compras (PMI, na sigla em inglês), elaborada pelo Markit/HSBC, caiu para 49,6 em janeiro em relação aos 50,5 em dezembro. O resultado ficou abaixo da marca de 50 que separa crescimento de contração e foi pressionado pela demanda doméstica e de exportação mais fraca.

O dado ruim da China pesou sobre as ações da Vale, empresa que destina cerca de metade de suas exportações de minério de ferro ao país asiático. Uma desaceleração da economia chinesa provoca o receio de que as vendas da empresa brasileira sejam afetadas.

"O PMI fraco da China provocou um mau humor internacional. A Bolsa caiu por influência externa, por causa do ambiente mais pesado lá no exterior", afirma Paulo Gala, estrategista-chefe da Fator Corretora.

"A Vale sofre muito com a queda do preço do minério de ferro e com a incerteza em relação a China, que pode crescer 7% este ano, o menor crescimento desde 1990", completa.

Os papéis preferenciais da Vale, os mais negociados, caíram 2,14%, a R$ 28,29, enquanto os ordinários (com direito a voto) perderam 2,07%, a R$ 31,15.

Na semana, as ações preferenciais da companhia acumulam queda de 6,23%, e as ordinárias perdem 4,80%. Além do dado de produção industrial, pesou sobre os papéis da companhia a desaceleração da China em 2013. O PIB (Produto Interno Bruto) do país cresceu 7,7% no ano passado, o mesmo percentual de 2012.

E essa desaceleração não afetou apenas as ações da mineradora. As siderúrgicas, em especial Usiminas e CSN –que têm na China um dos destinos para suas exportações–, registraram fortes quedas nesta semana.

As ações da Usiminas caíram 10,62% desde a última sexta-feira, enquanto as da CSN tiveram perdas de 12,07%. "Essas empresas vinham de fortes altas no ano passado e reverteram completamente a tendência afetadas diretamente por essas notícias envolvendo a China", afirma André Moraes, analista da corretora Rico.com.vc.

Em 2013, os papéis da Usiminas subiram 11,02% e os da CSN tiveram alta de 21,25%.

DÓLAR

O dólar atingiu o maior patamar em cinco meses ante o real após um aumento generalizado do mau humor do investidor com moedas de países emergentes, como o Brasil.

O dólar à vista, referência no mercado financeiro, subiu 0,97%, a R$ 2,395, maior patamar desde 22 de agosto do ano passado, quando a divisa encerrou cotada em R$ 2,4299.

O dólar comercial, usado no comércio exterior, avançou 1,26%, a R$ 2,403, maior nível também desde 22 de agosto de 2013 (R$ 2,432).

A China também contribuiu para a valorização da moeda nesta quinta-feira, ao aumentar a instabilidade no mercado cambial, afirma Guilherme Prado, especialista em câmbio da distribuidora de valores Fitta.

Das 24 moedas emergentes mais importantes, 18 tiveram desvalorização ante o dólar, uma ficou estável e cinco subiram. A maior desvalorização foi registrada pelo peso argentino, que caiu 12,40%, e a menor pelo dólar de Hong Kong. O real foi a quinta moeda a sofrer maior desvalorização ante a moeda americana.

"O dólar vem subindo com força no exterior ante as moedas emergentes. A China está desencadeando uma aversão ao risco, mas o dólar já sobe por conta de rumores de que o Fed (Federal Reserve, o banco central americano) possa retirar mais US$ 10 bilhões de seu programa de recompra de títulos", diz.

Notícia publicada no início da semana no "Wall Street Journal" indicava que a autoridade monetária americana promoveria novo corte de US$ 10 bilhões -de US$ 75 bilhões para US$ 65 bilhões- no seu programa mensal de recompra de títulos públicos já na reunião da próxima semana.

O corte dos estímulos enxugaria o volume de recursos disponíveis para investimento nos emergentes, como o Brasil, prejudicando tanto a Bolsa quanto o câmbio nacional.

"A tendência de alta do dólar é firme, independentemente da agenda política nacional e dos índices que estão sendo divulgados por causa do cenário global", afirma Fernando Bergallo, diretor de câmbio da TOV Corretora.

Outro foco de tensão para a moeda brasileira foi a forte desvalorização sofrida pelo peso argentino nesta quinta-feira. Cada dólar chegou a valer cerca de 8 pesos no câmbio oficial. E o dólar paralelo, comercializado em casas de câmbio ilegais, também disparou, para 12,40 pesos em algumas "cuevas" ou "arbolitos" do centro de Buenos Aires.

Para André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, a crise na Argentina cria não só uma desvalorização no Brasil, mas na América Latina como um todo. "Houve uma piora da perspectiva de risco com relação ao conjunto de emergentes, principalmente latino-americanos. Vale lembrar que a Argentina é o terceiro maior destino das exportações brasileiras", afirma.

Apesar disso, ele considera que a reação do mercado foi exagerada ao associar o risco Brasil ao risco Argentina. "Ficamos apreensivos com a situação do nosso vizinho, mas seria um equívoco imaginar que o efeito será forte aqui", afirma, em relatório.

Segundo Reginaldo Galhardo, gerente de câmbio da Treviso Corretora, os investidores começam a ficar preocupados se o Brasil não está adotando a mesma política intervencionista da Argentina. "O Mantega [Fazenda] aumentou o IOF [Imposto sobre Operações Financeiras] para estancar a saída de dólares, e o governo já interveio antes nas elétricas e não deixou a Petrobras reajustar o preço da gasolina para não pressionar a inflação", lembra.

"Como o governo lá tem mão grande e a gente também está com mão grande, o investidor começa a se preocupar como um todo", diz.

O Banco Central deu continuidade ao seu programa de intervenção diária no mercado e vendeu a oferta total de 4.000 contratos de swap cambial tradicional -equivalentes à venda futura de dólares- com vencimento em 1º de setembro de 2014. A operação teve volume financeiro equivalente a US$ 197,8 milhões. A autoridade monetária também ofereceu contratos de swap para 2 de maio, mas não vendeu nenhum.

O BC também vendeu todos os 25 mil contratos de swap na sexta etapa da rolagem dos vencimentos em 3 de fevereiro. Com isso, rolou pouco menos de 70% do lote total do mês que vem, equivalente a US$ 11,028 bilhões.


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