Os administradores do Banco BVA, liquidado em junho pelo Banco Central, entraram na Justiça para anular uma operação de cerca de R$ 1 bilhão que teria favorecido o grupo Caoa, prejudicando os demais credores da instituição. Dono de concessionárias e de uma montadora de veículos, o Caoa era sócio e o maior credor do BVA.
A suposta manobra, feita no dia em que o BVA sofreu intervenção do Banco Central, envolve dois contratos, que transferiram para o Caoa parte da carteira de empréstimos do banco: um no valor de R$ 222,7 milhões e outro no valor de R$ 765 milhões.
Ou seja, o empresário Carlos Alberto Oliveira Andrade, dono da Caoa, passou a ser o dono dessas dívidas. Com esse arranjo, o grupo passou a ter uma situação privilegiada em relação aos outros 4.000 credores --entre ex-funcionários, governo, clientes e outras instituições financeiras. Estes precisarão esperar o processo de venda de ativos e recuperação de créditos do BVA para ver se conseguem reaver alguma coisa.
O Caoa ficou livre desse rito porque levou uma parte dos ativos do banco antes que eles pudessem ser repartidos entre todos os credores. Pela legislação, como sócio e credor, o empresário seria um dos últimos a receber.
Agora, com os contratos, se levar calote do BVA, ele pode cobrar diretamente os devedores do banco. Na ação, os advogados afirmam que a operação provocou "uma diminuição maliciosa do patrimônio do devedor [BVA]".
O grupo Caoa afirma que os acordos firmados com o banco são regulares (leia texto abaixo).
ENTENDA O CASO
O BVA era um banco pequeno criado no Rio de Janeiro. Mudou para São Paulo alguns anos atrás e cresceu 980% entre 2007 e 2010.
Recebeu aplicações de fundos de pensão de empresas estatais e de prefeituras pequenas, que acabaram perdendo dinheiro com ele.
Em 2011, um de seus principais clientes, Oliveira Andrade, tornou-se sócio. Entre aplicações e participação no banco, chegou a ter R$ 1 bilhão. De acordo com a ação, o empresário fez diversos pedidos de saque em 2012.
Como o banco não conseguia mais honrar os pedidos de saque, tentou-se uma negociação com o Caoa.
Segundo apurou a Folha, um dos ex-controladores do banco, Ivo Lodo, concordou em liberar R$ 100 milhões se o empresário colocasse R$ 300 milhões em dinheiro novo. Em troca, o Caoa receberia cerca de R$ 1 bilhão como garantia, em créditos do BVA.
Esse acordo aconteceu uma semana antes da intervenção. Os créditos foram transferidos, só que o dinheiro não entrou no banco.
O BVA, que tem um rombo de R$ 4,7 bilhões, sofreu intervenção do BC em outubro de 2012. Oito meses depois, foi liquidado. Nesse meio tempo, os ex-controladores tentaram um comprador para evitar a liquidação.
O dono do grupo Caoa foi o candidato que chegou mais perto. Mas o negócio não deu certo porque o Fundo Garantidor de Créditos não aceitou as condições apresentadas.
OUTRO LADO
O grupo Caoa, por meio de sua assessoria de imprensa, afirmou que preferia não se pronunciar sobre o processo, porque ainda não foi notificado. Mas afirma que todas as garantias com o BVA, incluindo os contratos que somam R$ 1 bilhão, foram constituídas de acordo com a legislação em vigor.
Ivo Lodo, um dos ex-controladores do banco que, segundo a Folha apurou, participou da negociação dos contratos, também preferiu não comentar o assunto.
O liquidante do banco BVA, Valder Viana de Carvalho, que entrou na Justiça para reverter o acordo, não quis falar sobre o processo.