Folha de S. Paulo


Justiça do Trabalho bloqueia R$ 1 milhão de dona da marca M.Officer

A Justiça do Trabalho de São Paulo concedeu uma liminar a pedido do Ministério Público do Trabalho (MPT) para bloquear R$ 1 milhão da empresa M5 Indústria e Comércio, dona das marcas M.Officer e Carlos Miele.

O pedido foi feito após procuradores do Trabalho identificarem, em uma fiscalização feita na semana passada, que em uma oficina da região central de São Paulo bolivianos irregulares no país trabalhavam produzindo peças da marca M.Officer em um local considerado com condições sem higiene e sem segurança.

"Além do risco de incêndio, com fiação exposta, não havia extintores e o local estava em péssimas condições, segundo constataram os procuradores e fiscais do Trabalho que estiveram na oficina de costura. Um casal de bolivianos, os filhos e outras pessoas viviam todos em um mesmo quarto também sem condições de higiene", diz o procurador Tiago Muniz Cavalcanti, responsável pela Conaet (Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo).

A decisão da Justiça do Trabalho foi dada em caráter liminar, e a empresa pode recorrer. Foi obtida pelo MPT durante o plantão do judiciário no último dia 15, feriado nacional.

Nela, o juiz Helder Bianchi Ferreira de Carvalho determinou que a empresa providencie, em um prazo de 24 horas, a partir do momento que for comunicada, "a transferência dos trabalhadores, de filhos e parentes que com eles estejam trabalhando e/ou morando, para hotel, pensão ou alojamento que atenda às normas regulamentadoras de saúde e segurança, sob pena de multa diária de R$ 50 mil, além do imediato pagamento das verbas rescisórias".

A liminar também prevê que a empresa pague R$ 5.000 para "assegurar o pagamento de verbas rescisórias e eventuais despesas de retorno" à Bolívia.

De acordo com o procurador, a decisão de recorrer à Justiça foi tomada após a empresa ser procurada e "se recusar a assinar a carteira dos trabalhadores e reconhecer a ligação com a exploração desse tipo de trabalho degradante".

FORNECEDORES CERTIFICADOS

Em nota assinada pelo diretor Igor Mussoly, a empresa informa que "está tomando as medidas judiciais contra os responsáveis e trabalhará ombro a ombro com o Ministério Público do Trabalho e o Ministério do Trabalho e Emprego para elucidar os fatos".

Segundo a M5, ela tem uma "relação comercial de compra de produtos prontos e acabados com fornecedores idôneos, devidamente certificados pela ABVtex (Associação Brasileira do Varejo Têxtil), para posterior venda" em suas lojas.

De acordo com a nota, "os fornecedores da M5, que também são fornecedores de outras marcas famosas, são selecionados após criteriosa seleção e somente são aceitos se pré-certificados pela ABVTex ou pela SGS [firma que faz certificações e verificações]. A empresa é extremamente rigorosa com seus fornecedores exigindo, por contrato, o cumprimento integral da legislação trabalhista sob pena de denúncia às autoridades competentes, além de diversas outras severas sanções".

Consta no site da associação que ela foi criada em 1999 e que representa as principais redes do varejo nacional que vendem vestuário, bolsas e acessórios de moda, além de cama, mesa e banho. Juntos, os associados representam cerca de 15% das vendas do varejo nacional.

Entre seus objetivos e princípios, é citado "respeito à legislação, apoiando ações que visem a responsabilidade social, a formalização nas relações comerciais e o combate à concorrência fraudulenta."

Nas ações mencionadas no seu site, a associação informa que destaca-se o "desenvolvimento da certificação de fornecedores -- ABVTex junto à da cadeia produtiva e observância de aspectos ligados à responsabilidade social".

A Folha não localizou os representantes da entidade para verificar se o fornecedor da marca M.Officer consta na lista dos que certifica para a grife.

O nome desse fornecedor não foi citado nem pela empresa em seu comunicado nem pelo MPT.

AÇÃO CIVIL PÚBLICA

O Ministério Público de Trabalho informou que deve entrar em 30 dias com uma ação civil pública contra a empresa, mas que nesse intervalo pode ser assinado um termo de ajustamento de conduta para resolver a questão.

Na oficina, o grupo de fiscalização localizou "peças e acessórios, como etiquetas, botões e placas de metal que identificam a marca M.Officer, sendo costuradas nessa oficina clandestina. Havia ainda caixas de aviamentos, tecidos, modelagem, notas fiscais e pedidos de serviços demandados pela M5", afirma o procurador.

"Na oficina foi encontrada a ficha da peça-piloto com as especificações de como deveria ser costurada e a peça. A mesma ficha e a mesma camisa em produção foram encontradas na oficina, na confecção intermediária e depois na empresa. Era o mesmo produto sendo fabricado para a marca, uma camisa com cores diferentes", disse Cavalcanti.

Segundo um dos trabalhadores que prestou depoimento, a oficina presta serviço há sete meses e recebia peças para costurar de uma confecção localizada na rua Prates, em São Paulo.

O dono da confecção, cujo nome não foi divulgado nem o da empresa, confirmou que ele produzia para a marca M.Officer e que repassava peças para a oficina dos bolivianos, segundo informa o Ministério Público do Trabalho.


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