Folha de S. Paulo


Estreia do Twitter na Bolsa põe em evidência novos grupos de investidores em tecnologia

O príncipe Alwaleed bin Talal, da Arábia Saudita, deve ser um dos grandes ganhadores com o Twitter. E o mesmo vale para os endinheirados clientes do banqueiro Jamie Dimon.

Mas quando o Twitter foi arrastado por uma absurda avalanche de dinheiro na quinta-feira (7) --uma companhia que não existia oito anos atrás atingiu valor de mercado de US$31,7 bilhões ao final de seu primeiro pregão em bolsa--, o nome, quase incógnito, da hora era o de Suhail Rizvi.

Rizvi, 47, dirige uma companhia de investimento privado que é o maior investidor externo no Twitter, com participação de 15,6%, ou US$ 3,8 bilhões pelo valor de fechamento do primeiro dia de comércio das ações do grupo, quinta. Usando uma rede de contatos no mundo da tecnologia e finanças, bem como uma dose saudável de oportunismo, foi ele que atraiu muitos dos nomes mais proeminentes entre os investidores da empresa, a exemplo do príncipe saudita e alguns dos mais ricos clientes do JPMorgan.

A oferta inicial bem sucedida conduzida pelo Twitter também criou vencedores previsíveis como os co-fundadores Jack Dorsey e Evan Williams, além de um grupo de investidores tradicionais em tecnologia. Mas a ascensão de Rizvi mostra como uma nova categoria de investidores em tecnologia, dotados de fortes conexões com Wall Street, vem desbravando novos caminhos no insular e desconfortável território do Vale do Silício.

Tradicionalmente, empresas conhecidas do setor de capital para empreendimentos, como a Kleiner Perkins Caufield & Byers e a Accel Partners, usam o fato de que estão instaladas no vale e sua generosa dotação de capital para adquirir participações em empresas iniciantes, e alguma influência sobre o seu comando. A Benchmark Capital e a Spark Capital, duas dessas empresas, obtiveram participações consideráveis no Twitter.

Mas Rizvi e outros investidores como ele formaram uma rede de investimento, que inclui nomes proeminentes entre as administradoras de fundos como a Fidelity, T. Rowe Price e BlackRock - algumas das quais contam com recursos ainda maiores e se dispõe a aceitar participações menores, e influência zero na gestão da companhia.

Mas a oferta pública do Twitter representou uma espécie de festa de debutante para Rizvi, que continua a ser encarado como um mistério no Vale do Silício a despeito de seu número crescente de investimentos em tecnologia. No Vale do Silício e mesmo na sede do Twitter em San Francisco, investidores e executivos proeminentes dizem que nunca haviam ouvido falar dele até que seu nome surgisse em documentos relacionados à oferta pública inicial de ações que a companhia encaminhou às autoridades no mês passado.

Rizvi recusou diversos pedidos de entrevista. Mas entrevistas com nove pessoas próximas a ele ou que trabalharam com ele em passadas transações, todas as quais falaram apenas sob a condição de que seus nomes não fossem citados, o retratam como um operador estratégico que prefere agir nos bastidores.

Seu dinheiro e seus contatos também lhe valeram participações em outras startups procuradas: o aplicativo social de notícias Flipboard; o álbum virtual de recortes Pinterest; o serviço de pagamento Square, de Jack Dorsey; e, claro, a outra empresa de Dorsey: o Twitter.

Rizvi nasceu na Índia e vive em Greenwich, Connecticut. Os integrantes de seu poderoso e diversificado círculo de amigos incluem Richard Branson, fundador do Virgin Group, e Salar Kamangar, presidente-executivo do YouTub. E Rizvi foi avistado entre os convidados de uma festa no iate de Eric Schmidt, o Oasis, em Cannes.

Antes de chegar ao Vale do Silício, Rizvi investia nos setores de telecomunicações e indústria, mas suas maiores jogadas aconteceram no ramo do entretenimento.

Em 2004, ele pediu que um amigo comum o apresentasse a Jeff Berg, então presidente do conselho da agência de talentos International Creative Managament (ICM), que estava em busca de oportunidades de expansão. Um ano mais tarde, Rizvi comandou o investimento de um grupo de capital privado na agência, adquirindo participação controladora no negócio por US$ 100 milhões - com financiamento de US$ 95 milhões oferecido pelo Merrill Lynch.

Isso criou uma plataforma para subsequentes transações que incluíram uma participação na produtora Summit Entertainment, que abocanhou os direitos cinematográficos da série "Crepúsculo"; e um acordo com Hugh Hefner para o fechamento do capital do grupo Playboy. Essas transações despertaram o interesse de outros investidores do setor de capital privado.

Mas nem tudo foi tranquilo para Rizvi. Ele e outros executivos de sua companhia, a Rizvi Traverse, enfrentam dois processos abertos por investidores insatisfeitos do Michigan e Texas, relacionados a um empréstimo para financiar filmes que deu errado em 2008. E uma porta-voz da ICM diz que os dirigentes da agência estavam tão insatisfeitos com o seu suserano no ramo de capital privado que optaram por adquirir a participação de Rizvi e a de Berg, que havia levado o investidor à companhia inicialmente.

Um porta-voz da Rizvi Traverse diz que os processos judiciais contra ela são frívolos.

Em 2011, Rizvi começou a realizar grandes lucros com sua incursão a Hollywood. Ele se saiu notavelmente bem com a venda de sua parte na ICM, de acordo com duas pessoas informadas sobre a transação, e manteve uma carteira de participações nos lucros de séries como "Friends" e "Os Simpson", antes de vendê-las a outra companhia de investimento por US$ 150 milhões. E em 2012, a Lionsgate Entertainment adquiriu a Summit por mais de US$ 400 milhões, gerando um belo lucro para Rizvi, segundo as mesmas fontes.

Para celebrar a venda da Summit, Rizvi marcou um café da manhã com um amigo no restaurante Casa Lever, e durante a refeição, cercado por uma impressionante coleção de obras de Andy Warhol, ele declarou que estava cansado de investir em mídia tradicional; passaria a investir em empresas que combinassem mídia e tecnologia.

Àquela altura, ele já havia começado a adquirir ações no Twitter, por intermédio de Chris Sacca, um investidor em empresas iniciantes do Vale do Silício que fundou a Lowercase Capital.

Os dois foram apresentados em 2006 em uma festa que Branson deu em sua casa na ilha caribenha de Necker, de acordo com um porta-voz da Rizvi Traverse, e logo se tornaram amigos e começaram a trocar ideias de investimento.

Em 2010, Sacca ofereceu uma oportunidade a Rizvi: Evan Williams, um dos fundadores do Twitter, estava deixando a companhia, e Sacca acreditava que ele pudesse ser persuadido a vender parte de suas ações.

Rizvi se interessou pela ideia e afirmou conhecer outros investidores que também desejariam participar. O JPMorgan havia criado pouco antes um fundo de crescimento digital para clientes de alto patrimônio, e lhes oferecia acesso a algumas das startups mais recentes do Vale do Silício. Com Sacca como intermediário, Rizvi logo começou a comprar ações diretamente de funcionários do Twitter em nome de seus clientes, abocanhando quase US$ 300 milhões para o príncipe Alwaleed bin Talal, da Arábia Saudita, Ed US$ 400 milhões para o JPMorgan Chase.

Mas ele ainda assim conseguiu se manter quase invisível. Alguns investidores no Twitter disseram que, em dado momento, quando sua participação na empresa estava crescendo, eles brincaram imaginando se não era necessário verificar os antecedentes criminais do investidor.

Não é fácil encontrar fotos de Rizvi na Web. O perfil dele no Twitter tem acesso fechado, e a foto associada a ele é a de um pavão - uma criatura notória pela modéstia, até que estende sua esfuziante plumagem.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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