Taí um caso em que não há problema em chamar Jesus de palhaço, sem prejuízo para nenhum dos dois lados, nem para aquele que transforma água em vinho nem para os que ganham o pão fazendo outro tipo de graça.
A versão de "Godspell" que estreia nesta semana empacota o evangelho em um estilo de interpretação que roça a linguagem dos clowns.
Quem assina a direção é Dagoberto Feliz, palhaço de formação e ator com experiência em gêneros populares. Feliz é um dos fundadores da trupe paulistana Folias D'Arte, cujo início de trajetória nos anos 1990 se dedicou a pesquisar os musicais dos alemães Kurt Weill e Brecht.
Essa roupagem clownesca talvez não caísse muito bem a "Jesus Cristo Superstar", musical que estreou em 1970 e foi à Broadway no ano seguinte. A versão bíblica de "Godspell" entra no circuito logo depois, com versão "menos porrada", como define Feliz. "Godspell" tem forma de cantar de louvação", diz.
Enquanto, na cena da crucificação, o Cristo "superstar" era questionado sobre sua verdadeira causa, em "Godspell", o coro chora sob o lamento de "estou sangrando".
A suavidade, porém, não torna "Godspell" necessariamente menos político. Considerado o mais realista, é o Evangelho Segundo São Mateus que dá base ao roteiro. A versão dedica-se a mostrar um Cristo combativo, ao qual o italiano Pier Paolo Pasolini (1922-1975) também recorreu em uma produção de 1964.
A investida de Feliz em aproximar "Godspell" do clown, diz ele, traz questões contemporâneas ao palco, em especial a aproximação com o ator. O palhaço frequentemente reage ao comportamento do público, tornando evidente que, por trás do personagem, há o intérprete.
A direção, ademais, opta por exibir a estrutura do teatro, com cordas e pilares expostos. No papel de Jesus, revezam-se os atores Leonardo Miggiorin e Rafael Pucca.
GODSPELL
QUANDO Qui., às 21h; sex., às 17h e às 21h30; sáb., às 21h; dom., às 20h; até 9/10
ONDE Teatro das Artes - shopping Eldorado, av. Rebouças, 3.970, tel. (11) 3034-0075
QUANTO R$30 a R$100; livre