Folha de S. Paulo


CRÍTICA

Busca trágica por felicidade afunda os personagens da peça 'Krum'

Com sua roda de personagens comiseráveis girando em falso atrás de felicidade, o espetáculo "Krum" retoma questões fundamentais na obra de Anton Tchekhov (1860-1904): opõe um par de ilusões humanas à difícil tarefa de compreender o cotidiano e a passagem do tempo.

A diferença é que o faz fora do campo que convencionou-se chamar realismo.

Com texto do israelense Hanoch Levin (e com a atriz Renata Sorrah no elenco), a montagem não exibe uma história tal qual ela transcorreria em tempo presente.

Seu empenho é o de buscar outro tempo. Entre a idealização de um futuro e as desilusões subsequentes, há a formação de um conjunto de memórias fantasmagóricas: juntos, os personagens de "Krum" vivem o trauma de amadurecer entre impossibilidades. Cheios de lembranças, eles afundam.

A formação dessa memória-movediça acompanha uma vontade criativa do protagonista, um escritor.

Ele renuncia à felicidade servindo-se do mal-estar alheio, em um último ato de perversidade. Sua ideia é retratar a mesquinhez de conterrâneos, expurgar um diagnóstico para a melancolia.

A montagem de Marcio Abreu procura apresentar projeções espectrais da narrativa. Com vozes dilatadas por microfones, com a disritmia da iluminação, que se esvai antes que a cena termine, cria-se a sensação de que aquilo que vemos no palco não está mais acontecendo. Pena que este efeito, tão rico, se dissolva no transcorrer da peça.

O espetáculo refaz, assim, um percurso conhecido na história da filosofia, a busca pela felicidade.

O britânico Bertrand Russell (1872-1970) deu dicas de um possível encontro. Para ele, a felicidade reside no interesse pela vida, e a diversidade de interesses se imporia ainda como fator determinante, em oposição à tristeza de viver o gosto por um algo só.

Talvez seja esta a falta trágica dos personagens de "Krum': um autor que os decreta infelizes antes do tempo. O interesse é pela juventude, a lápide, o casamento.

KRUM
QUANDO sex. e sáb., às 21h; dom., às 18h; até 26/7
ONDE Sesc Consolação - r. Dr. Vila Nova, 245; tel. 3234-3000
QUANTO de R$ 12 a R$ 40
CLASSIFICAÇÃO 16 anos
AVALIAÇÃO muito bom


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