"Não chapado, mas lindo." Esse último verso de "Are You Experienced?", música de Jimi Hendrix, também fecha o filme "Estudos Superficiais" do artista Gustavo Speridião.
Na Funarte, estão agora justaposições de fotogramas extraídos do filme, mas não na ordem em que aparecem na versão cinematográfica. É como se na mostra o artista destrinchasse sua narrativa apocalíptica para expor quanta realidade pode haver nesse delírio de destruição em massa.
No caso, um belo delírio. Speridião também não parecia estar chapado, talvez só impressionado pela beleza, quando construiu essa narrativa ao longo de sete anos, filmando lugares do mundo todo em preto e branco, mas voltando sempre à imagem de um cemitério de mísseis entre as cenas mais díspares.
"Em palavras, a história é que a humanidade é foda, tudo é lindo", diz Speridião. "Mas tudo isso pode acabar. É contradição em cima de contradição, amálgamas."
Ou seja, um míssil fincado no chão contrasta com o que parece ser um piquenique diante de uma nuvem em forma de cogumelo, lembrando uma explosão nuclear. Noutra série, um ralo ordinário ecoa os contornos de um anfiteatro em ruínas.
Speridião cria, na verdade, uma sucessão de escalas e sentimentos antagônicos, pequenos momentos de felicidade contrapostos a visões acachapantes de uma violência ou destruição em potencial.
Sua visão descosturada e contraditória do mundo, de fato, lembra a do cineasta francês Chris Marker, como dizem alguns críticos, mas o "chiaroscuro" sci-fi do autor de "La Jetée" é relido aqui em chave mais pop, talvez até mesmo superficial, como diz o nome desse trabalho.
Enquanto Marker foi na contramão da lógica do cinema fazendo de uma de suas maiores obras uma fotonovela com imagens estáticas, Speridião usa a estética veloz do videoclipe em seu filme e só se aproxima de Marker quando revela a lógica de sua farsa, expondo os seus momentos privilegiados na galeria.
Nesse sentido, os tais estudos superficiais de Speridião ganham maior ressonância. É a atenção ao detalhe, dos azulejos metálizados do metrô de Praga ao fundo de uma piscina cintilante, que resiste como último lampejo de beleza diante do caos.
GUSTAVO SPERIDIÃO
QUANDO todos os dias, das 14h às 22h; até 3/8
ONDE Funarte, al. Nothmann, 1.058, tel. (11) 3662-5177
QUANTO grátis