Folha de S. Paulo


Crítica: Estreia de Neschling no Theatro Municipal de SP tem altos e baixos

Quatro temporadas após a traumática demissão da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp), John Neschling, 65, estreou como diretor artístico e regente titular da Orquestra Sinfônica do Theatro Municipal de São Paulo (OSM).

Durante os 12 anos em que liderou a Osesp, Neschling transformou uma orquestra sucateada em um acontecimento artístico-cultural marcante da história brasileira recente.

Sua missão atual no Municipal tem, entretanto, outro viés: ele assume após uma elogiada e premiada temporada dirigida por Abel Rocha que, em curto tempo, resgatou a vocação operística do Municipal como contraponto aos concertos sinfônicos da Sala São Paulo.

Assim, em um primeiro momento, a mudança de direção rompe com uma continuidade conquistada a duras penas, ao adiar para o segundo semestre de 2013 a produção regular de óperas.

Por outro lado, espera-se que a experiência de Neschling --junto com uma força política maior-- possa dar o passo que a gestão anterior não conseguiu, a saber, implementar a fundação que, enfim, dará mais estabilidade e independência ao Municipal.

APLAUSOS

Ao entrar para o concerto de estreia, no sábado (23), o maestro foi bastante aplaudido. Juntos, o governador Geraldo Alckmin e o prefeito Fernando Haddad acompanharam a apresentação até o final.

O programa foi aberto com "Prelúdio" e "Morte de Amor" do drama "Tristão e Isolda", de Richard Wagner (1813-83). Após três notas solitárias dos violoncelos, o "acorde de Tristão" surge nas madeiras para deixar tudo em suspensão, em uma melancolia perene.

ATAQUES E TIMBRE

Às madeiras, justamente, faltou um pouco de homogeneidade nos ataques e no timbre. O som das cordas, por outro lado, esteve redondo e envolvente em Wagner, mas sofreu nas passagens rápidas da obra seguinte, a "Sinfonia nº 2" de Camargo Guarnieri (1907-93).

Quem conhece a gravação do próprio Neschling com a Osesp sentiu falta da ressonância após o acorde final do primeiro movimento, bem como de uma equalização mais perfeita entre tímpanos, metais e cordas. Mas, aqui, as madeiras estiveram inspiradas.

Fecharam o concerto as "Quatro Peças Sacras", de Verdi (1813-1901), com a participação dos corais Lírico e Paulistano (que integram os corpos estáveis do Theatro).

No "Stabat Mater" (segunda peça), hino medieval que narra o sofrimento de Maria diante da agonia de Jesus, e no arcaico "Te Deum" (quarta peça), vozes e orquestra uniram e mediram
forças. Em alguns momentos o coro esteve forte demais, invadindo a textura.

"Ave Maria" (primeira peça) e "Laudi alla Vergine Maria" (terceira peça) foram escritas para coro "a cappella" (sem acompanhamento instrumental), apesar de que, no início desta última, a afinação foi dada por um órgão fora do palco.

Apenas para vozes femininas, "Laudi" utiliza os sete primeiros tercetos do canto final de "A Divina Comédia" de Dante Alighieri (1265-1321).

O trecho em que o poeta afirma que buscar a graça sem recorrer à Virgem é "como querer voar sem asas" talvez tenha sido o momento mais tocante da noite.

JOHN NESCHLING E ORQUESTRA SINFÔNICA DO THEATRO MUNICIPAL DE SP
AVALIAÇÃO bom


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