Folha de S. Paulo


Fora do Eixo criou universidade e partido informais

Diz o cuiabano Pablo Capilé que há "duas narrativas possíveis" e conflitantes para explicar o Fora do Eixo, rede de coletivos que funciona em 188 pontos do país.

Rede de coletivos Fora do Eixo ganha poder ao expandir ações pelo país
Fora do Eixo compartilha casa, cartão de crédito e criação de um bebê

"Uma é [que] 'eles chegaram agora e se sentaram na janelinha'", ironiza o dirigente sobre o poder de influência que a rede ganhou.

"A outra", continua, "é falar em como contribuíram para a mudança do mapa da música brasileira, conectaram coletivos, organizam o festival Grito Rock em 30 países e têm 'universidade' que trabalha na formação estética, política e social do aluno".

Para Paulo Sarkin, vice-presidente da Federação Nacional de Músicos Profissionais, "o discurso messiânico deles serve para solidificar uma panelinha na qual só tocam aqueles que se dispõem a enfrentar um esquema amador e cachês incertos. Ou seja, para jovens aventureiros".

Entre 2009 e 2013, o Fora do Eixo inscreveu ao menos 392 projetos em mecanismos de fomento à cultura das três esferas de poder: municipal, estadual e federal.

Segundo a rede, que publica todos os dados na internet (até senhas de Facebook), foram captados cerca de R$ 12 milhões dos cofres públicos entre 2010 e 2012. A soma corresponde a 29% do total investido pela rede em projetos.

Esses recursos foram usados para multiplicar ações como festivais, palestras, comércio de produtos e consultorias, que geraram uma receita de quase R$ 30 milhões no mesmo período.

Com mais de 2.000 colaboradores, o Fora do Eixo deixou de agir apenas na cena musical e passou a atuar fortemente no campo político.

Hoje, os coletivos da rede participam de debates sobre temas tão diversos como violência policial, descriminalização de drogas e políticas públicas para a cultura.

O Fora do Eixo ganhou projeção ao bater de frente com a ex-ministra da Cultura Ana de Hollanda, a quem acusavam de falta de diálogo, de ser pró-Ecad (entidade que administra direitos autorais) e de paralisar a cultura digital.

"A ex-ministra acabou mobilizando movimentos sociais da cultura, que se articularam na retomada de algumas políticas", diz Otto Ramos, da Casa Fora do Eixo do Amapá.

À Folha, Ana rebate a crítica sobre falta de diálogo: "É inteiramente infundada".

EMPODERAMENTO

Hoje, o Fora do Eixo tem universidade e partido informais, criados para divulgar e multiplicar suas ações.

Membros do movimento evitam usar a palavra "influência". "Não faço questão de ter o telefone pessoal da ministra [Marta]. Me posiciono publicamente. A força disso faz com que a informação chegue às pessoas a que tem de chegar", diz Capilé.

Para ele, a mobilização dos coletivos representa "uma nova forma de fazer política".

A expansão desse "empoderamento" levou a casos pontuais de membros do Fora do Eixo em cargos públicos. Otto Ramos, por exemplo, é presidente do Conselho Estadual de Cultura do Amapá e destina todo o seu salário para o movimento.

Para Capilé, a rede tem "força para presidir conselhos de cultura no Brasil inteiro". "Não o fazemos porque queremos incentivar mais gente a participar dessa parada", conclui.


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