Joseph Blatter, 79, nasceu em Visp, Suíça, no coração da Europa. Mas, desde que ingressou na Fifa, 40 anos atrás, aprendeu do seu maior padrinho político que era preciso agradar à periferia do futebol para ficar no poder.
Foi conquistando um apoio quase incondicional de África e Ásia que ele sobreviveu por 17 anos na presidência da federação internacional.
Em sua gestão, a Copa do Mundo foi de maneira inédita ao continente africano (2010) e voltou ao Brasil depois de 64 anos (2014). Também nos anos Blatter, o Oriente Médio foi agraciado pela primeira vez para organizar a competição (Qatar-2022).
Tudo como ensinou João Havelange, mandatário entre 1974 e 1998, que dobrou o número de seleções no Mundial e investiu na expansão para outros continentes com a intenção de tirar o poder das mãos da elite europeia.
Afinal, é impossível dissociar Blatter do seu antecessor. Ambos fazem parte da mesma estrutura política.
Foi o brasileiro quem levou à Fifa o suíço, um ex-jogador amador de futebol formado em administração e economia, que havia trabalhado na federação local de hóquei no gelo e na organização da Olimpíada de 1972 e 1976.
Blatter foi contratado em 1975. Seis anos depois, virou secretário-geral, o segundo cargo da entidade. Assim, tornou-se aprendiz de Havelange. Em 1998, quando o dirigente decidiu deixar a presidência, o braço direito foi a indicação imediata.
A primeira eleição foi a mais apertada das cinco de Blatter. Ele bateu Lennart Johansson, opositor histórico de Havelange, por 111 a 80.
Depois, vieram as vitórias sobre Issa Hayatou, em 2002, a reeleição sem adversários, em 2007, a exclusão de Mohammed bin Hammam, em 2011, e o sucesso contra o príncipe Ali bin Hussein, na semana passada. Sempre com apoio maciço da periferia e contra crescente onda de oposição da Europa.
Os agrados políticos (e financeiros, já que cada pleito era acompanhado de generosa bonificação aos votantes) tinha uma intenção quase secreta: além de garantir a reeleição, Blatter sonhava faturar o prêmio o Nobel da Paz.
Sua aposta era que o trabalho de integração social feito pela Fifa nos países pobres pudesse lhe dar tal honraria.
BLINDAGEM
Até as investigações conduzidas pelos EUA que levaram à renúncia, Blatter parecia blindado a escândalos.
Não que seus anos à frente da Fifa não tivessem casos nebulosos. Mas eles nunca chegavam ao presidente.
Três anos depois de assumir, a ISL, principal parceria comercial da Fifa, caiu em caso semelhante ao atual, de pagamento de propinas para obtenção de acordos. Segundo a Justiça suíça, Blatter teve conduta "desajeitada", mas não recebeu dinheiro.
Outra bomba estourou em 2010, com as suspeitas de suborno nas escolhas das sedes das Copas de 2018 e 2022.
O caso derrubou membros do Comitê Executivo da Fifa, fez com que a entidade criasse um comitê de investigação e mudasse o processo de definição de escolha dos países organizadores do torneio.
A desconfiança aumentou quando o relatório final do comitê de investigação, feito pelo norte-americano Michael J. Garcia, não foi divulgado. Garcia se revoltou e deixou o cargo, o que pode ter sido o estopim para o início do fim de Blatter na Fifa.