Folha de S. Paulo


Por remédios, Secretário da Saúde de SP sofre ameaças de morte e de prisão

Jorge Araújo/Folhapress
O secretário David Uip (Saúde), que cobra verbas federais
O secretário estadual da Saúde, David Uip, que sofreu ameaça por carta anônima

Em uma semana, o secretário paulista da Saúde, David Uip, enfrentou três ameaças de prisão e uma de morte. Todas envolvem pedidos de remédios caros, que não estão na lista do SUS.

A ameaça de morte, que está sendo investigada pela Secretaria de Segurança Pública, veio em forma de carta anônima. O autor se identificou como ex-militar, especialista em explosivos. Disse que a mulher está com cirrose hepática em estágio avançado e que mataria Uip caso ela morresse sem a medicação.

A pessoa não especifica o remédio, mas a hipótese é que seja um novo tratamento (composto pelas drogas sufosbuvir, daclatasvir e simeprevir) que dobra chances de cura em relação ao convencional. Em 2015, o Ministério da Saúde adquiriu esses medicamentos para 30 mil doentes com cirrose, HIV e câncer, ao custo de R$ 1 bilhão.

"O número inicial de compra é inferior ao doentes. A estimativa é que no Brasil tenhamos 2 milhões de doentes e, em São Paulo, 430 mil. O que eu faço com esse número?", questiona Uip.

Atualmente, o Estado de São Paulo gasta cerca de R$ 1 bilhão por ano para atender a demandas extra-SUS por medicamentos. Um exemplo de remédio que motivou duas ameaças de prisão foi o canabidiol. Uma das ações, movidas pelo Ministério Público Federal, pedia a prisão de Uip caso o Estado não entregasse a substância a nove pacientes de Marília (SP).

Outra juíza da região de Bauru ameaçou pedir a prisão do secretário caso o canabidiol não chegasse em 48 horas para um paciente do município de Ourinhos (SP).

Segundo a secretaria, leva-se mais de três meses para o remédio ser importado, conforme normas da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). "Custa US$ 200 a seringa por dia. De onde eu tiro esse dinheiro que não está no meu orçamento? É insustentável. Estou perdendo a governabilidade", diz o secretário.

Há uma década o país vive um crescente aumento do processo de judicialização na saúde, com pessoas buscando na Justiça remédios não disponíveis no SUS.

A questão é que os orçamentos são finitos e, para atender a uma pequena parcela que busca esses remédios por via judicial, gestores precisam retirar o dinheiro de outras áreas da saúde.

O governo paulista cumpre 47 mil condenações, com gasto anual de R$ 1 bilhão. Desse total de ações, 69% são de médicos da rede privada de saúde. Outras 482 ações são de medicamentos sem registro na Anvisa.

"Quase 90% do valor gasto pelo Estado de São Paulo na judicialização é para atender a apenas 4% do total de medicamentos requeridos na via judicial. Isso significa que cerca de R$ 900 milhões são gastos para atendimento de uma parcela muito pequena da população."

O custo do Estado com todo o atendimento SUS em assistência farmacêutica (distribuição de remédios nas farmácias) é da ordem de R$ 600 milhões, para atendimento a 700 mil pessoas.

Para tentar frear a enxurrada de ações, Uip fará uma parceria com a USP para que ela dê parecer técnico sobre remédios pedidos nas ações. Também acionará Conselho Nacional de Justiça contra decisões judiciais arbitrárias.


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