Folha de S. Paulo


José Renato Nalini: Chefe do Tribunal de Justiça de SP

'Revoltados, jovens deixarão presídio com fúria vingativa'

Contrário à redução da idade penal, o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, José Renato Nalini, 69, afirma que "nem tudo o que o povo quer é o mais correto e ético".

Ele defende mudanças no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) e avalia que a juventude não vai se atemorizar com ameaças legais.

O tema divide o Judiciário. Para o desembargador José Muiños Filho, do Rio, diz que "o medo das consequências" é essencial para coibir crimes.

Bruno Poletti-28.nov.2014/Folhapress
José Renato Nalini, 69, presidente do TJ de São Paulo
José Renato Nalini, 69, presidente do TJ de São Paulo

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Folha - A maioria da população apoia a redução da maioridade. É preciso responder a essa vontade popular?
José Renato Nalini - A vontade popular tende a reclamar a redução da maioridade penal, assim como aceitaria a pena de morte e outros agravamentos de pena, tudo como forma de responder à sensação de impunidade. Ao atender à vontade da maioria, o Parlamento teria observado uma regra democrática. Democracia é o governo da maioria, no qual a minoria tem condição de se manifestar. Nada obstante, nem tudo o que o povo quer é o mais adequado, correto e ético. Seguramente, a discussão chegará ao Judiciário.

Que outras medidas, que não a redução da maioridade, poderiam ser adotadas?
Aumento dos efetivos policiais, intensificação da vigilância, criação de novos tipos penais (novos crimes), agravamento das penas para os crimes já existentes. Redução dos benefícios hoje assegurados ao encarcerado, como regime aberto ou semiaberto, progressão de regime, perdão judicial.

O ECA ainda é um instrumento eficaz para reeducar e ressocializar o jovem infrator?
O ECA precisa ser revisto e adaptado à realidade. Temos de pensar em reeducação e em ressocialização. Seria dinheiro e tempo perdido segregar o infrator se ele não tivesse condições de ser recuperado. Um bom começo seria ampliar o prazo de internação compulsória, caso o crime e circunstâncias, especiais, a arbítrio do juiz, justificassem tal extensão. Também é urgente cuidar do psicopata ou sociopata, que não pode permanecer sem custódia.

Faz sentido o temor de quem é contrário à redução de que o peso da lei recaia sobre os jovens mais pobres?
Faz sentido. Assim como o aparelhamento de facções criminosas para o recrutamento de crianças ainda mais novas, a fim de contornarem a lei. O subproduto nefasto será a revolta dos encarcerados mais jovens, considerando-se injustiçados e deixando o presídio com fúria vingativa.

O que fazer com o adolescente que comete crimes bárbaros?
Esse adolescente justificaria a extensão do período de internação num estabelecimento correcional como a Fundação Casa.
Não se pode ignorar que há perfis psicopatas ou sociopatas, que não merecem o tratamento dispensado a outros jovens que não representem a mesma periculosidade.

Um adolescente preso vai exigir atenção diferente do juiz?
A Justiça é um serviço especializado em tratar desigualmente os desiguais. O jovem preso precisaria ter uma formação intensificada, vinculada a um efetivo reaproveitamento desse indivíduo para ser útil à sociedade.

Pode haver reflexo imediato com punição aos jovens?
Não se espere que os jovens recuem, se estiverem dispostos a perseverar na senda da delinquência. A juventude sem freios inibitórios, totalmente entregue ao seu próprio descontrole, não se atemoriza com ameaças legais. Sabe que sua vida está a prêmio, que seu futuro não é róseo, não elimina a hipótese de consentimento ao homicídio perpetrado pela polícia, uma espécie de opção pelo suicídio.


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