Folha de S. Paulo


Racionamento voluntário vira briga em condomínios de São Paulo

A disputa pela melhor vaga na garagem, o salto alto no andar de cima, a música alta da festinha noite adentro e, agora, as torneiras secas. A crise hídrica se juntou ao nada seleto rol das reclamações em condomínios que ensejam brigas entre vizinhos e vão parar até na Justiça.

Longe de atingir as metas de economia, um edifício em Higienópolis, bairro nobre de São Paulo, resolveu seguir, no mês passado, o que outros prédios da cidade já fizeram: instituir o "autorracionamento" de água.

O corte no fornecimento foi estabelecido das 23h30 à 6h em caráter experimental -sem que o tema fosse levado à assembleia de condôminos.

Afixado no elevador, o aviso informava que era preciso economizar -na sexta (21), o sistema Cantareira operava com 9,7% de sua capacidade- e que, com a baixa pressão do fornecimento da Sabesp, a medida era necessária para abastecer a caixa-d'água.

Adriano Vizoni/Folhapress
O advogado Cesar Barbone conseguiu uma liminar contra seu condomínio que, segundo ele, cortava o fornecimento de água
O advogado Cesar Barbone conseguiu uma liminar contra seu condomínio que, segundo ele, cortava o fornecimento de água

Em menos de um mês, a conta do prédio de R$ 3.200 caiu quase à metade, e a meta da Sabesp para o desconto de 30% na fatura foi atingida.

Com a boa notícia, porém, veio uma surpresa menos agradável: uma liminar obrigou o condomínio a reestabelecer o abastecimento 24 horas por dia, sob pena de multa diária de R$ 100.

Síndica do prédio, a professora Maria Bachcivangi Garcia não sabia, mas a poucos andares do seu apartamento, "dormia o inimigo".

Incomodado com a falta de água quando chegava em casa após o trabalho, o advogado Celso Henrique Barbone, 34, resolveu acionar a Justiça.

Para ele, não havia justificativas para a medida."A síndica tomou uma atitude completamente arbitrária. Pela lei, o que ela deve fazer é zelar pelo fornecimento", diz.

O oficial de Justiça chegou ao edifício quase na hora em que o registro seria fechado, para surpresa da professora. "Nunca deixei de dialogar, por isso não imaginava que ele fosse à Justiça."

O tema ainda divide opiniões. Para Hubert Gebara, vice-presidente de Administração Imobiliária do Secovi-SP (Sindicato da Habitação), o que deve imperar é a decisão aprovada em assembleia.

"Se a maioria aprovar que não vai ter água, é uma decisão soberana", diz Gebara.

Já o presidente do Comitê de Habitação da OAB-SP, Marcelo Tapai, afirma que não basta a decisão da maioria: é preciso que 100% dos moradores concordem. Agir por conta própria, então, muito menos. "Em casos assim, cabe até indenização por danos morais", diz ele.


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