Folha de S. Paulo


'Sou pai por mérito', afirma padrasto incluído no registro

Foi numa reunião da escola que João (nome fictício) descobriu: ali, o pequeno Eduardo (nome fictício), de quatro anos, já dizia que tinha dois pais. "Ele já me chamava de pai em casa, mas, quando você ouve isso fora, é algo mais forte. Então pensei: é oficial. Sou pai por mérito", relata.

O contato com o menino começou um ano antes, ao se casar com a mãe do garoto. A partir daí, passou a levá-lo ao médico, ao dentista, à escola –às vezes, até à casa do pai biológico, que o garoto via uma vez por semana.

Com o passar dos anos, veio a preocupação. "Eu pensava: e se acontecer alguma coisa comigo? Ele não tem direito a nada?", conta João.

"Qualquer viagem eu tinha que procurar o cartório. E aí eu pensava: poxa, também sou pai, tenho que pedir autorização?". Decidiu procurar o pai biológico do garoto. "Falei: quero ser o pai dele."

A ideia era entrar com um processo de adoção –o nome de Luís* sairia da certidão de nascimento do filho, com 14 anos na época, para dar lugar ao de João. O pai biológico concordou.

"Quando fui fazer a audiência, vi que o menino chamava os dois de pai", conta o juiz Sérgio Kreuz, de Cascavel (PR). Foi aí que ele sugeriu: iria colocar o nome dos dois na certidão.

"Foi o primeiro caso que nós tivemos [no Estado] com dois pais", conta o advogado Ildo Forcelini. O pai biológico diz que ficou mais tranquilo. "Estamos garantindo um futuro melhor para ele."

Alterar a certidão, no entanto, não foi tão simples. "O cartório se recusou a mudar e tivemos que pedir ajuda do oficial de Justiça", relata João. O problema se repetiu com o RG. Para o passaporte, os dois pais e a mãe assinaram o pedido.

E para Eduardo, o que mudou? Tímido, o adolescente de 16 anos não quis falar com a reportagem. Aos pais, com os quais comemora hoje o Dia dos Pais, disse que gostou da mudança –ao mesmo tempo em que sentia receio de que, na escola, estranhassem.

Sua mãe não arrisca dizer qual será a reação das pessoas no futuro, mas avalia que a saída deixou o filho feliz. "Nunca foi dito que ele tinha que escolher. Mas, para a criança, isso pesa. No fim, ele se sentiu mais protegido", comemora.


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