Folha de S. Paulo


Ultrassom sim, mas sem exageros

Esta é para as grávidas aflitas para ter certeza da saúde do bebê em gestação, para as curiosas que querem ficar olhando o rostinho do bebê antes de ele nascer, e sobretudo para quem está considerando comprar seu aparelho para usar em casa: o exame de ultrassom, que a internet diz ser "100% seguro" e "isento de contraindicações", não é exatamente inócuo, por isso não deve ser abusado –sobretudo exames tridimensionais de alta resolução, que usam ondas mais fortes que os outros.

Noções básicas de física já deveriam levantar suspeitas. A ultrassonografia se baseia no bombardeamento do corpo com rajadas de ondas mecânicas de alta frequência, acima da capacidade auditiva humana, e na captação do eco das ondas refletidas –como o sonar de um submarino– para gerar uma imagem dos órgãos internos, invisíveis através da pele. Em laboratórios, frequências ultrassônicas são usadas para dissociar e até mesmo matar células. Por isso Pasko Rakic, um dos maiores especialistas mundiais no desenvolvimento do sistema nervoso, suspeitou que o exame pré-natal não fosse tão completamente inofensivo assim.

De fato, Pasko descobriu que, aplicada a camundongas gestantes em condições comparáveis às dos exames feitos com mulheres grávidas, a ultrassonografia tem o potencial de perturbar a migração dos neurônios que formarão o cérebro dos filhotes. Quanto maior o tempo de exposição, maior a porcentagem de neurônios que se perdem ao longo do trajeto de migração do local onde eles nascem até seu destino no córtex cerebral. A porcentagem sobe de 5% nos animais controle para 19% em animais expostos ao ultrassom por sete horas, o maior tempo testado no estudo.

Ainda assim, nada de pânico: numa gestação humana típica, o feto é exposto por recomendação médica a um total poucos minutos de ultrassom. E décadas de exames de ultrassonografia feitos durante o pré-natal confirmam que os riscos eventuais de uma exposição pequena sob orientação médica valem os benefícios oferecidos a mãe e bebê.

Mas é importante reconhecer que a ultrassonografia não é "100% segura": ela tem, sim, o potencial de perturbar a formação do cérebro. Assim como todo remédio tem efeitos colaterais e uma dose segura, mas pode matar se consumido em excesso, a ultrassonografia não é fotografia –deve ser usada com bom senso e orientação médica.


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