Folha de S. Paulo


Rebú no cemitério

O que era um drama silencioso e pessoal ganhou, nos últimos meses, um tom político -quase ideológico. Mobilizou a igreja. Virou assunto de Estado: afinal, onde devem ser enterrados os animais de estimação?

Hoje, os donos têm quatro opções: enterrar no quintal, encaminhar à necropsia, usar o serviço da prefeitura ou contratar um sepultamento/cremação particular.

Enterrar um corpo no quintal é desaconselhável. Contamina o solo e os lençóis freáticos. Afinal, na morte, somos todos iguais.

Já a necropsia é uma opção quando a causa da morte do animal não está clara e se deseja investigar um eventual erro médico ou descartar riscos à saúde humana.

Se optar pela remoção pela prefeitura, o proprietário pode levar o corpo a qualquer clínica veterinária. Cada uma cobra o que quer para manter o cadáver num freezer. O serviço se limita a despachar o corpo com os resíduos de saúde do local, para ser incinerado. Mas imaginar o animal queimado como lixo hospitalar é chocante para muitos.

Na esteira dessa angústia surge um mercado promissor: o de crematórios e cemitérios particulares de animais. O primeiro apareceu há 20 anos. Hoje, na Grande São Paulo, já são mais de uma dezena. Refletem uma mudança nas relações sociais: trazidos para dentro de casa e criados como filhos, cães e gatos são cada vez mais membros das famílias.

A família múltiespécie foi parar num projeto de lei: vereadores paulistanos aprovaram em primeira votação que os bichos sejam enterrados nos jazigos de seus donos, nos cemitérios municipais. A ideia incomodou a Igreja Católica e levou o arcebispo de São Paulo a procurar o prefeito, argumentando que a mistura depreciaria a dignidade humana ou emprestaria aos animais uma dignidade igual à dos homens, o que, para ele, seria inaceitável.

Pode ser a opinião de dom Odilo Scherer e até de muita gente, mas, ao julgar pela multiplicação dos cemitérios de animais, não é o que pensam outras milhares de pessoas.


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