RIO DE JANEIRO - Um leitor me recorda que, há anos, sugeri nesta coluna que o Brasil instituísse o recall eleitoral. Ou seja, que, em qualquer momento, os eleitores pudessem pedir de volta os votos que haviam dado a um candidato e o ajudado a se eleger. Se esse recall fosse significativo, o governante deveria devolver o mandato, pegar o boné e retirar-se da cena política.
A ideia revelou-se impraticável, mas parece que, sem bagunçar o calendário, o Brasil fez algo do gênero nessas últimas eleições. Pediu de volta os votos que havia confiado a muita gente e os depositou na conta de outros políticos, alguns dos quais mal tinham entrado na história. Ou apenas os jogou no lixo.
O maior rombo foi no PT. Teve de devolver toneladas de votos, perdeu dois terços das prefeituras que comandava, entre as quais as de todas as grandes cidades e as do ex-"cinturão vermelho", o ABCD paulista, e caiu do terceiro para o décimo lugar entre os partidos — rumo à zona do rebaixamento. E sempre que suas figurinhas carimbadas, Lula e Dilma, subiram ao palanque de um candidato para apoiá-lo, este batia na madeira e via os seus votos baterem asas rumo ao adversário.
No caso de Lula, parece um recall a priori. É como se o eleitorado já estivesse lhe retirando, às mancheias, os votos de que ele se gabava para 2018 — resta ver se lhe sobrará algum. E Dilma, cujos 54 milhões de votos em 2014 foram martelados à náusea por sua tropa de choque no Senado, pode hoje, cassada, pedalar sua desimportância por Rio e Porto Alegre — ninguém a afaga, ninguém a hostiliza.
Mas não somente o PT saiu desidratado. Todos os caciques regionais — Aécio Neves em Minas Gerais, José Sarney no Maranhão, Renan Calheiros em Alagoas, a família Campos em Pernambuco — perderam índios em massa. Cada índio, um voto. A tribo debandou.