Dois posicionamentos diametralmente opostos de ministros da equipe econômica sobre comércio exterior afrontam a coerência fundamental para a retomada da confiança empresarial –etapa indispensável para a volta do crescimento.
O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, declarou à margem do Fórum Econômico Mundial, realizado em Davos, que a redução das tarifas de importação, peça básica na integração às cadeias globais de valor, somente será admitida se houver reciprocidade de outros países no bojo de acordos comerciais.
Já sua colega da Agricultura, Kátia Abreu, disse o oposto, em entrevista à Folha, ao propor o fim do protecionismo tarifário para alguns ramos industriais.
Tais manifestações sugerem ou incoerência da política econômica, e aí será preocupante, ou um debate sobre diretrizes para a arrancada do comércio exterior. Os ministros foram bastante claros na exposição de seus argumentos.
Para Barbosa, não devem ser esperadas reduções nos impostos de importação, embora estejam acima da média internacional e reúnam diversas distorções. O objetivo do governo, diz, é o aumento da eficiência econômica, mas sem abrir mão do protecionismo. Parece, a seu ver, secundário que isso não incentiva a produtividade e encareça a produção, ao onerar máquinas e insumos importados.
Com visão mais crítica, a ministra da Agricultura diz que "alguns setores da indústria, que são protegidos há décadas", atrapalham os "setores que já viveram em mais dificuldades, com menos subvenção, e que foram atrás da inovação e da tecnologia e venceram", em clara referência à agricultura.
Ela adicionou um argumento ausente da tese de Barbosa: o câmbio, que por anos castigou a produção, agora "está muito competitivo para as exportações". Nesses pontos concordo com a ministra.
É importante destacar questões a serem respeitadas em uma política de inserção externa da economia. Antes, cabe sublinhar que a orientação renovada pelo ministro de que os membros do Mercosul não devam promover revisões tarifárias unilateralmente é a mesma que vem sendo seguida há 20 anos.
Dela emanaram as distorções de nossas relações externas: nem fomentamos competência produtiva para evitar expedientes protecionistas nem fizemos fé nos acordos bilaterais e plurilaterais de comércio.
Atraso e isolamento foram as consequências. Reproduzir essa política é como assistir a um filme gasto de tanto reprisado, cujo final não é feliz. É hora de mudar essa diretriz, e nada melhor para isso do que um cronograma de cortes tarifários e negociação de concessões comerciais com outros países.
Precisamos mudar o eixo do desenvolvimento, de uma economia fechada e protecionista para um modelo aberto e competitivo. Nessa evolução, acordos comerciais vantajosos e revisão tarifária não são movimentos excludentes, mas partes afins da mesma estratégia.
Importante é que elas impulsionem procedimentos que até agora marcharam lentamente tanto na área privada como na pública. Pelo lado privado, é necessário dar celeridade à inovação e aos ganhos de produtividade –condições essenciais diante do desafio da competição internacional.
O governo, por sua vez, precisa aceitar que a política comercial não deve se subordinar aos limites territoriais, já que o mercado de bens e serviços adquiriu dimensões globais, operando praticamente sem fronteiras.
A adaptação a essa realidade requer reformas sobre as quais muito se fala e nada se faz, como a tributária, a trabalhista, a da simplificação e outras. Se algo assim começar a acontecer, dificilmente o empresariado não se fará presente. No passado é que não podemos ficar.