As 396 páginas produzidas pelo grupo criado pela FIA para investigar o acidente de Bianchi foram interpretadas por muitos como uma peça de acusação ao francês.
"A FIA lavou as mãos. Simulou um julgamento para se livrar de responsabilidades", disse Tambay, 114 GPs nas costas. Foi esta a leitura que a imensa maioria dos fãs fez.
É uma meia verdade.
Em todo o texto, em apenas um momento a FIA aponta o dedo para Bianchi, ainda assim colocando-o no bolo com todos os seus colegas.
É quando afirma que "se os pilotos respeitassem a regra das bandeiras amarelas duplas, nenhum competidor e nenhum fiscal teria corrido riscos".
Há uma sutileza quando o relatório diz que "Bianchi não reduziu suficientemente a velocidade". Quem lê apenas o resumo publicado na internet, pode ficar com a impressão de acusação ao francês. Vem daí todo o alarde.
O busílis está na íntegra do relatório. Ele não reduziu por que errou? Por que não quis? Por que é mau piloto? Por que desrespeitou a sinalização das bandeiras?
Não. Bianchi não reduziu por causa de uma questão técnica.
Uma das novidades desta temporada é que os carros de F-1 passaram a contar com um sistema eletrônico de freios nas rodas traseiras, o "brake-by-wire".
É algo bem complexo e tem a ver com o acúmulo de energia para o ERS e a potência que toda a unidade de potência despeja nos eixos.
Houve pilotos que sofreram com isso no início da temporada, Massa entre eles.
Se um time com a estrutura da Williams enfrentou dificuldades nesta sintonia fina, imaginem uma Marussia pré-falimentar... O relatório traz a análise da telemetria do carro 17.
Informa que o freio eletrônico do carro de Bianchi era "incompatível" com o "critério de erro zero" exigido pelo regulamento, que determina que a unidade de potência deve ser imediatamente cortada quando o piloto pisa no acelerador e no freio ao mesmo tempo.
"Nos dois segundos em que Bianchi percorreu a área de escape, ele aplicou força nos dois pedais, usando os dois pés. No entanto, o algoritmo criado para cortar a potência foi inibido pelo monitoramento do torque, que controla o brake-by-wire."
Traduzindo: ou Marussia cometeu uma negligência pontual ou seu sistema sempre foi uma porcaria ou houve grave uma falha técnica.
São todas explicações plausíveis. Com potencial para tornar Bianchi passageiro de um carro de 700 kg que, a 126 km/h, acertou um guindaste de 6500 kg.
Após 44 dias lutando pela vida num hospital do Japão, Bianchi foi transportado para a França, onde permanece inconsciente e em estado crítico. Dificilmente sobreviverá.
Mas a culpa não foi dele. Nem a FIA disse isso.
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