Folha de S. Paulo


Bueiros e isenções

RIO DE JANEIRO - O Rio é lindo e não faltam motivos para andarmos de cabeça erguida, apreciando a paisagem. Mas, infelizmente, o bom-senso tem exigido que caminhemos pelas ruas e calçadas de olhos fixos no chão, ziguezagueando para não pisar em bueiros.
Porque aqui eles adquiriram o péssimo hábito de explodir. Alguns ferem pessoas, outros danificam carros. Há aqueles que lançam chamas de altura e intensidade suficientes para derreter um orelhão, como aconteceu terça-feira no Flamengo, zona sul.
Como muitas cidades destruídas por guerras na África e no Oriente Médio, também temos nossas minas terrestres. Às precauções rotineiras de quem vive em uma metrópole somamos o cuidado de não pisar naquelas tampas de ferro, de tamanhos e formatos variados.
Há um ano, uma turista norte-americana teve 80% de seu corpo queimado ao pisar em um bueiro no momento da explosão. Em abril, a tampa de outro, arremessada aos ares pela força do estouro em uma galeria subterrânea, caiu sobre o teto de um táxi e feriu cinco pessoas. De lá para cá, pelo menos outros seis foram pelos ares.
Em entrevista pouco depois do acidente com o táxi, o presidente da Light, concessionária de energia elétrica responsável por grande parte dos "bueiros-minas" da cidade, disse que existiam pelo menos 130 galerias subterrâneas não vistoriadas, que poderiam estar sob risco de explosão.
Relação de benefícios fiscais usufruídos por empresas no Estado entre 2007 e 2010, obtida pelos jornalistas Italo Nogueira e Marco Antônio Martins, mostra que a Light obteve isenções e diferimentos (prazo ampliado para o pagamento de impostos) que, somados, chegam a mais de R$ 522 milhões.
Se um pouquinho desse valor fosse usado para "desativar" essas minas terrestres, poderíamos voltar a apreciar a paisagem.


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