Uma mulher na Inglaterra passou por mastectomia, concordou em dar entrevista a um jornal e ter publicada sua foto em reportagem sobre câncer. Cinco anos mais tarde, um namorado fez busca sobre seu nome na internet, achou a reportagem, se aborreceu e desmanchou o namoro. Ela pediu ao jornal que retirasse da web o seu nome e a sua foto.
Um homem nos EUA se internou em clínica de reabilitação para alcoólatras e aceitou que seu nome e foto aparecessem em reportagem sobre recuperação de viciados em drogas. Três anos depois, recuperado, teve grande dificuldade para conseguir emprego porque empresas faziam busca de seu nome na internet e desconfiavam dele.
Estes são dois exemplos recentes de um dilema com que jornalistas e empresas de comunicação têm se defrontado devido à nova realidade criada pelo enorme acesso a informações que os recursos tecnológicos da internet proporcionam a milhões de pessoas.
Pelo que se observou da intensa discussão gerada pelo tema no recente encontro mundial de ombudsmans de comunicação, ainda não se estabeleceu consenso sobre como agir nesses casos.
A maioria dos veículos de países desenvolvidos adotou a prática de, quando há erros em matéria arquivada, indexar a ela uma correção. Alguns, como o jornal inglês "The Guardian", esperam 24 horas antes de arquivar eletronicamente o texto, de modo que, se alguma correção tiver de ser feita, ela possa ser incorporada ao original antes de ser arquivada.
Todos se preocupam, obviamente, com a integridade do arquivo. A qualquer jornalista com preocupações éticas repugna a idéia de permitir que se altere o que foi publicado porque é evidente o perigo de distorções históricas graves que precedentes desse tipo podem provocar.
Mas também é indiscutível que a facilidade atual de achar em segundos documentos não necessariamente corretos ou cujos fatos tenham sido desmentidos pelo tempo sobre a vida de qualquer pessoa pode criar constrangimentos, prejuízos ou até tragédias pessoais irreparáveis.
Mesmo quando não há erro ou deslize ético por parte do veículo, como nos dois casos citados acima, a situação do meio de comunicação se torna delicada.
Será que, de agora em diante, ele deve passar a alertar o entrevistado de que sua história e sua imagem poderão ser acessadas pelo público para o resto da vida antes de obter a autorização para contá-la e expô-la? Será que, depois de refletirem sobre isso, tantos entrevistados se recusem a ponto de inviabilizar a operação jornalística?
Atendi recentemente a um leitor que me pediu que a Folha apagasse de seus arquivos duas matérias em que ele foi entrevistado quando jovem. Ele afirma que contêm informações falsas. Mesmo que não houvesse inverdades, ele como qualquer outra pessoa poderia ter se arrependido de algumas afirmações, talvez produtos de arroubo juvenil, a que todos estão sujeitos.
A Secretaria de Redação me informou que "a Folha não altera seu arquivo digital, por considerar que isso seria "reescrever" a história, modificar o que já foi impresso", que "todos os erramos publicados estão na versão digital, mas ainda não estão indexados à matéria correspondente" e que está "trabalhando para fazer isso em breve."
Faço votos de que o "em breve" seja breve e que o jornal considere a possibilidade de, em alguns casos extremos, por razões humanitárias, abrir exceções à regra de não mexer no arquivo eletrônico.