Folha de S. Paulo


Famílias de vítimas de Alcântara ainda esperam indenização

Dez anos após o acidente que matou 21 engenheiros e técnicos na base de lançamento de foguetes de Alcântara, no Maranhão, as famílias das vítimas ainda esperam respostas do governo.

Ao todo, 19 famílias pedem indenização por danos morais e materiais em um valor maior do que a quantia cedida pelo governo na época, de R$ 100 mil por família e assistência médica por um ano.

Os filhos das vítimas recebem uma bolsa de R$ 820,83 até os 24 anos. "O problema é que esse valor não dá nem para pagar uma faculdade", diz Doris Maciel, coordenadora da Associação de Viúvas das Vítimas de Alcântara, mãe de duas filhas adultas.

"Além disso, estamos sem assistência de saúde", diz.

Karime Xavier/Folhapress
Doris Maciel, com foto do marido morto em 2003, Sergio Cezarini
Doris Maciel, com foto do marido morto em 2003, Sergio Cezarini

Dos 19 pedidos de indenização, 15 receberam despacho favorável na 1ª instância, mas a União recorreu. "Estamos aguardando julgamento no tribunal", diz o advogado José Oliveira, irmão de uma das vítimas e presidente da Associação das Famílias das Vítimas de Alcântara.

O valor reivindicado em cada ação varia de acordo com a idade do profissional morto, o tamanho da sua família e a idade dos filhos. Oliveira pediu que a quantia solicitada não fosse revelada por motivo de segurança.

O acidente, ocorrido em 22 de agosto de 2003, foi causado pela ignição antecipada de um dos propulsores do foguete, chamado de VLS-1 (Veículo Lançador de Satélites), por uma pane elétrica.

O VLS-1 estava em solo, ligado à torre de lançamento, que pegou fogo. Os 21 profissionais do CTA (atual Comando-Geral de Tecnologia Aeroespacial), órgão da Aeronáutica, estavam na torre.

As famílias também pedem respostas quanto aos motivos do incêndio. A Justiça Militar arquivou, em março de 2005, o IPM (Inquérito Policial Militar) que apurou o caso.

"Pedimos a reabertura do processo criminal. Estamos aguardando manifestação da Procuradoria-Geral da República", diz Oliveira.

OBSTÁCULOS

A torre de lançamento do VLS-1 foi reconstruída após o acidente de 2003. Mas o lançamento de teste deve levar mais dois anos para acontecer, de acordo com o diretor da AEB (Agência Espacial Brasileira), José Raimundo Coelho. Ele conversou com a Folha durante reunião anual de cientistas no Recife.

Pelo andar das obras, o teste será realizado em 2015 --com três anos de atraso.

Alex Argozino/Editoria de Arte/Folhapress

Somente depois disso, a base poderá lançar o Cyclone-4, foguete que está sendo construído pela empresa binacional do Brasil e da Ucrânia ACS (Alcântara Cyclone Space), criada em 2006.

Alcântara é considerado um dos melhores locais do mundo para lançamentos de foguetes com satélites comerciais pela proximidade ao Equador. A órbita mais explorada comercialmente (chamada geoestacionária) fica no plano do Equador, onde estão os satélites de telecomunicações.

A estimativa é que os foguetes que lancem satélites de Alcântara economizem até 30% do combustível.

Para ser construída, a base levou à desapropriação de 62 mil hectares de uma comunidade quilombola. Os moradores sobreviviam da pesca, mas as terras para onde parte deles foi levada não permitem essa atividade.

"Isso nunca vai deixar de ser um trauma", diz Coelho. Hoje, há 26,6 mil quilombolas morando na região.

Segundo ele, a AEB tentará integrar a comunidade por meio de projetos de educação que, acredita, terão apoio da prefeitura de Alcântara e do governo do Maranhão.


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